domingo, 25 de setembro de 2011

Beleza é Fundamental?





Vinicius de Moraes começou oficialmente a discussão quando lançou seu famoso pedido de perdão às ‘muito feias’, afirmando que ‘beleza é fundamental’. E a discussão perdura até hoje. Nesta semana, por exemplo, um grupo de amigos e eu viajamos nas possibilidades que esse assunto suscita. A divergência de opiniões fez nascer esta crônica: será que a beleza é mesmo fundamental?

Minha experiência pessoal diz que não. Ser uma beldade não me fez falta alguma. A feiúra é que me trouxe muitos benefícios, por sinal. Lembro de um episódio na adolescência, quando as colegas de aula começaram a externar seu interesse pelo sexo masculino. Reuniam-se à hora do recreio para compartilhar seus segredinhos amorosos e tecer  comentários a respeito do jogo de futebol do fim de semana – única atividade significativa para os jovens na vila,  interior do RS. Claro que ‘as bonitas’ não estavam interessadas no jogo, e sim nos jogadores. E nós, ‘as feias’, não dávamos atenção nem a um, nem a outro. Nossos assuntos eram livros, música e televisão, coisa muito estranha para garotas naquela região. Motivo que levou uma professora  atenta a procurar nossas mães – éramos 2 feias assumidas – e sugerir tratamento psicológico, pois nosso comportamento era definitivamente distinto do das jovens de nossa idade. Para espanto da professora, nossas mães se entreolharam e uma disse a outra: não te falei, comadre, que nossas filhas nos dariam muito orgulho? As ‘muito bonitas’ que me perdoem, mas continuam na vila até hoje, acomodadas com seu entretenimento semanal. As ‘feias’ partiram para estudar e realizar sonhos.

Mas minha vida não foi só de estudos. As feias também amam! Ainda na vila, porém não tão precocemente graças à falta de  beleza, tive meu primeiro namoradinho. Acredite quem quiser, mas era justamente um dos  craques do time, e o mais cobiçado pelas meninas. Nunca tive tantas inimigas na vida! Pois pior do que a rejeição em si, para uma bela jovem, é perder o alvo dos seus desejos para uma feia. O segredo da conquista eu desconheço. Mas certamente não foram meus olhos verdes, já que não os possuo. Desconfio de algo, contudo: o tempo que não perdi a frente do espelho reclamando de minha feiúra, e muito menos por razões narcisistas, foi empregado de alguma forma mais inteligente.

A esta altura, sei que surgirá uma boa alma para afirmar que não sou assim tão feia quanto faço parecer nesta crônica. E essa observação vem bem a calhar com meu objetivo: mostrar que beleza física é coisa totalmente relativa. Uns concordariam sem pestanejar com minha feiúra, outros se arriscariam a mencionar alguns traços belos e um só se levantaria para me qualificar como beldade, rara em formosura e musa de seus poemas: meu esposo. Para ele, que me escolheu, não tenho dúvidas de que sou sumamente bela. Portanto,  nessas condições – e somente nessas - beleza é, sim, fundamental!

O espelho é traidor, não devemos confiar integralmente nele. Ou dirá que existem milhares de outras mais belas, provocando em nós crises de isolamento e depressão; ou reforçará em nós a vaidade, fazendo-nos crer numa beleza suprema e absoluta que na verdade não existe. Por que é tão difícil aceitarmos a nós mesmas como únicas e incomparáveis? Por que insistimos em seguir um padrão, tirando aqui, acrescentando ali, fazendo tudo para ficarmos cada  vez mais iguais e portanto mais comuns?! Não compreendo isso, não aceito essa insatisfação feminina. Por ser mais uma vez a divergente, numa sociedade que reverencia traços físicos sobrepondo-os aos de caráter, fico à espera da professora que virá sugerir a mim tratamento psicológico, pois eu é que sou a louca – além de feia, considerando os padrões convencionais.

Meu olhar nessa questão vai além do que sugere a estética. Existe, sim, a beleza que agrada aos olhos e isso é muito bom. Mas ser somente bela é um problema. É preciso existir também um refinamento, uma delicadeza em gestos e palavras. E depois de agradar aos olhos, ainda é preciso agradar a alma com outra forma de beleza: a virtude. Essa vem realçar e dar vida a primeira. Trata-se da conduta inquestionável, baseada em elevados padrões morais, que faz com que traços comuns brilhem numa mulher, tornando-a única e distinta. A harmonia que se percebe nesse conjunto é o que melhor define para mim a verdadeira beleza. E ela está acessível a todas que tenham um mínimo de vaidade para cuidarem do corpo, e uma boa dose de bom senso para substituírem a vulgaridade pelo que é digno e refinado – em palavras, atos e vestuário.

Daí vem minha conclusão: Vinicius de Moraes e as ‘somente belas’ que me perdoem, mas VIRTUDE é fundamental!

Suzy Rhoden
Gravataí, 25 de setembro de 2011





segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Nossa Cultura, Nossas Tradições



            

           

Não temos escolha, nascemos atrelados a ela pelo local de nosso nascimento. Mas se pudéssemos escolher, mudaríamos algo? Normalmente nossa cultura é tão enraizada, nossa tradição  firmemente estabelecida  desde o berço, que se torna parte de nós e nos identifica como indivíduos pertencentes a um grupo. Assim, sequer cogitaríamos a possibilidade de outro traço cultural, ainda que pudéssemos elegê-lo. Aceitamos nossa herança, passamos a fazer uso diário dela

Vejo com olhos positivos essa característica do ser humano. É importante termos uma identidade cultural, amarmos e defendermos aquilo que é tipicamente nosso – nosso povo, nossa terra, nossas tradições. Penso que aquele que não sabe valorizar o que é seu, não saberá jamais apreciar o que é do outro; será um crítico permanente de todas as manifestações culturais, ignorante e vazio de seu próprio conteúdo.

Venho de uma terra que serve como modelo nesse assunto. Ijuí, no noroeste do RS, promove anualmente a Festa Nacional da Cultura Diversificada, festejo que reúne representantes de 12 etnias colonizadoras da cidade e região. Ao longo dos dias de exposição, culturas diferentes dividem o mesmo palco, apresentando suas danças típicas em clima de total cordialidade e harmonia. Para quem deseja estender seu conhecimento à gastronomia de cada país, é possível, por exemplo, começar o dia com o famoso café vienense elaborado com apfestrudel (cuca recheada com maçã) e sachertort (torta de chocolate) na Casa Austríaca; almoçar a tradicional paella na Casa Espanhola ou quem sabe o vatapá da Casa Afro; degustar uma esfiha ao longo da tarde, enquanto aprecia a beleza da dança do ventre, típica da cultura Árabe; e ainda terminar a noite ao som das marchinhas alemãs, após ter saboreado o famoso chucrute. Perfeita convivência de muitas nações, distintas entre si. Fronteiras que se alcançam com uns poucos passos, de uma casa cultural a outra.

Porém, nem sempre é essa a cena que se vê: intolerância ergue muralhas, visíveis ou não, separando povos e culturas. Revela-se um outro tipo de ignorância, pior do que a daquele que nega suas raízes. É a ignorância do que realmente acredita na supremacia de sua cultura, demonstrando desprezo pela tradição alheia. Ao invés de exaltar seus costumes, ataca e deprecia a prática de outras regiões – como se houvesse a necessidade de uma cultura prevalecer sobre as demais, e como se isso realmente fosse possível!

Não precisamos ir ao exterior para encontrar exemplos de povos que não se entendem: de um estado para outro, dentro de nosso Brasil, são visíveis as diferenças. E nem todos sabem lidar bem com isso. Recebi, há algum tempo, mensagens insistentes em minha página de relacionamento, provenientes de um conterrâneo, apresentando conteúdo ofensivo ao povo paulista. As palavras usadas eram fortes, carregadas de ódio, e lançadas de forma generalizada sobre todos os habitantes de São Paulo - faziam lembrar um ataque terrorista de alguém que entra armado em local público, atirando para todos os lados. Um terrorismo em palavras. O propósito de tal disparate? Não entendi, nunca vou entender. Não há como explicar um absurdo.  Mas, por via das dúvidas, ‘terrorista’ e sua arma – as tais mensagens - foram banidos imediatamente de minha página.

Situação inversa vivi há alguns anos, quando então fui eu a vítima de comentário maldoso. A ‘terrorista’ da vez era uma jovem paulista, com a qual eu tinha acabado de travar conhecimento. Suas palavras traduziam seu desprezo pelo povo gaúcho. Apesar da situação constrangedora, considerei prudente ignorar sua observação naquele momento. Era óbvia a generalização baseada em experiência anterior, certamente desagradável, que ela tivera com algum conterrâneo meu – seria o ‘terrorista’?! Ponderadamente, escrevi um bilhete explicando que sou gaúcha, sim, que tenho muito amor por minha terra, sim, mas que não me responsabilizava por todos os gaúchos com os quais ela já tinha tido contato. Porém estava sinceramente disposta a conhecê-la e a respeitá-la em sua individualidade, e a convidava a fazer o mesmo, para então termos condições de expressar julgamento uma sobre a outra.  No encontro seguinte recebi um pedido de desculpas. E nos demais que se seguiram conheci uma de minhas mais queridas amigas. Para nós, foi-se para sempre a muralha que separava São Paulo e Rio Grande do Sul.

Considerando nossa natureza ‘bairrista’ e os exemplos citados, será possível expressar amor a nossa terra sem depreciarmos a cultura do outro? Certamente. Convivi durante algum tempo com uma jovem pernambucana, apaixonada por sua cidade, Recife. Falava, contudo, de maneira tão positiva que ao invés de criar em mim rejeição por seu estado, o que normalmente acontece nessas situações, vi desabrochar um desejo imenso de conhecer as belezas nordestinas! Terá sido coincidência eu vir a me casar com um gaúcho que morou por algum tempo justamente na cidade de Recife?

A exemplo dessa amiga querida, aproveito esta Semana Farroupilha para expressar meu amor pelos pampas onde cresci, tenho vivido, e sido muito feliz. Amo a vida gaudéria que meu estado me proporciona, sinto-me orgulhosa da riqueza de nossa cultura, da beleza de nossas danças típicas, da indumentária recatada e elegante que nos caracteriza – a pilcha. Temos no dia 20 de setembro o ‘precursor da liberdade’, conforme faz lembrar nosso hino. Celebramos nessa data o Dia do Gaúcho: um dia para relembrar a luta de outros tempos, e a tradição que não pode ser perdida ao longo dos anos. Dia para ser comemorado com churrasco e  ‘bebemorado’ com chimarrão, sorvido na roda de amigos, passando a cuia de mão em mão.

Essa é a minha identidade, a minha raiz, e para onde  for levarei comigo os traços dessa tradição que me acompanha: seja no sotaque,  nas expressões regionalistas ou nas minhas preferências gastronômicas. Eu sou do sul, é só olhar pra ver que eu sou do sul, conforme os versos de uma canção gauchesca que muito ouvimos por aqui. E isso dizemos com orgulho de nossa terra, com amor por este chão, mas sem a pretensão arrogante de afirmarmos supremacia.

Lembrando novamente que não me responsabilizo por todos os gaúchos com os quais meu leitor possa ter tido contato... Há sempre, em todos os estados e países, um terrorista das palavras disparando sua insanidade como se fosse metralhadora. É ele, o insensato, quem deve ser banido (no sentido de ignorado), e não a cultura ou o povo que ele eleva ou denigre.

Suzy Rhoden

Gravataí, 19 de setembro de 2011




       

quarta-feira, 14 de setembro de 2011

Juventude da Promessa!




           
Baile Black & White, Estaca Gravataí, em 10/09/11


Todos os dias, a mídia traz até nós uma triste realidade no que concerne as escolhas de diversão de nossa juventude. São casos de jovens envolvidos com drogas, festas rave  onde tudo é permitido a despeito das conseqüências, brigas de torcidas, jovens alcoolizados que depois da balada se envolvem em sérios acidentes de trânsito, abreviando sua própria vida ou, o que é pior, a vida de humildes trabalhadores que naquele horário estão nas paradas de ônibus, em sua luta diária por um pouco de dignidade para sua família. A lista segue, e é imensa, de atrocidades disfarçadas de diversão; escolhas de uma juventude confusa em seus padrões e irresponsável em seus atos.

 Porém, isso não me intimida. Entristece-me certamente, mas não me faz temer o futuro. Porque conheço e convivo com um outro grupo, que se diverte também, mas com padrões elevados de conduta. Esses bons rapazes e moças me dão motivos para crer que o mundo não está perdido, que não caminha para seu próprio fim, pois enquanto alguns se divertem ceifando vidas, estes brilham desenvolvendo seus talentos em atividades salutares e genuinamente divertidas.

 Refiro-me aos jovens de A Igreja de Jesus Cristo dos Santos dos Últimos Dias. Num primeiro momento, pode parecer estranho a alguns associar a palavra diversão à religião, contudo afirmo que isso é possível. Fazemos isso em nossa prática religiosa, acreditando que diversões sadias não ofendem ao Senhor, mas são necessárias para a boa formação de nossos jovens. Cantamos, dançamos, realizamos bailes, atividades esportivas, conferências, acampamentos, numa grande variedade de atividades de modo a envolver nossos jovens e satisfazer sua necessidade de interação social. Eles, inclusive, participam diretamente do processo de organização de eventos, sob nossa supervisão, pois acreditamos que dessa maneira desenvolvem desde cedo características de liderança, em especial aprendem o valor do comprometimento e da responsabilidade individual para se alcançar a unidade e o sucesso como grupo.

Tive um maravilhoso exemplo disso no último sábado, fato inclusive que inspirou este texto. Atuo como Primeira Conselheira na Organização das Moças, composta por uma presidente, duas conselheiras e uma secretária. Somos responsáveis pelo cumprimento de um programa sério, que envolve o ensino do evangelho e a organização de eventos que promovam o desenvolvimento de nossos jovens. Atuamos em âmbito de Estaca, ou seja, lideramos 7 unidades, também organizadas com sua liderança local seguindo o mesmo modelo da Estaca com sua presidência. Nossa responsabilidade recai sobre jovens de 12 a 18 anos incompletos. A mesma organização existente para as moças existe para os rapazes, e dentre os próprios jovens há um representante feminino e um masculino de cada unidade, o que compõe o que chamamos de Comitê de Juventude da Estaca. É com esse grupo diretamente que trabalhamos e com o qual vivi experiência marcante na última semana.

Após reunião determinando o tema do evento a ser organizado, nossos jovens colocaram mãos a obra. Tinham a missão de promover um baile. Desejaram, para abrilhantar a atividade, apresentar uma dança de abertura e então, com total comprometimento, agendaram ensaios e prepararam coreografia. Isso fortaleceu nos jovens a unidade, pois aprenderam a trabalhar em equipe, selecionando as melhores ideias de acordo com a ocasião, motivando e animando uns aos outros. No sábado, dia do evento, estavam todos presentes com a devida antecedência para cuidar da decoração. Fizeram excelente trabalho de divulgação. E em tudo reconheceram nossa autoridade como líderes, mantendo-nos informados de suas decisões, acatando nossa aprovação ou não para suas iniciativas.

Importante salientar que não temos um clero remunerado. Nosso serviço na igreja é voluntário, embora sejamos designados para uma responsabilidade específica conforme inspiração de nossos líderes. Nossa motivação, portanto, não é financeira. Acreditamos em uma religião prática, que vai além dos ritos de adoração, orientando nossa vida de acordo com princípios e padrões elevados. Vivemos também uma lei de saúde, da qual o álcool definitivamente não faz parte. Do mesmo modo, não há comercialização de qualquer tipo durante nossos eventos, havendo eventualmente lanche saudável distribuído como gentileza aos participantes.

Nesses termos, aconteceu o baile. A abertura foi feita pelos jovens do Comitê de Juventude da Estaca no salão cultural de nossa igreja, após breve momento espiritual. Sua dança foi executada com habilidade. Mas penso que não foram os passos bem ensaiados que garantiram o sucesso da noite, e sim a unidade daquele grupo que se refletiu sobre todos os presentes. Podíamos sentir seu ânimo, sua alegria por estarem ali, dando vida ao evento. Concluíram sua coreografia levando tantos quantos desejaram para a pista, para dançarem com eles. Assim foi concluída a parte ensaiada da noite, mas a melhor parte ainda estava por vir, e essa não foi planejada, simplesmente aconteceu: como se ninguém conseguisse ficar parado, a pista foi sendo preenchida por muitas pessoas dançando a mesma coreografia. A música mudava, vinha nova coreografia, e o grande grupo só aumentava, todos unidos numa mesma dança, e numa perfeita forma de diversão. 

 Foi algo maravilhoso de se ver e que, sinceramente, me fez lembrar do show do Black Eyed Peas, ao vivo, no encerramento do programa programa da Oprah Winfrey, em Chicago, quando uma jovem começou sozinha uma coreografia e logo havia uma multidão fazendo a mesma dança, para surpresa absoluta de Oprah! A diferença numérica é lógica, nosso grupo era bem menor. Mas levamos vantagem em outro quesito: não ensaiamos as coreografias seguintes, elas simplesmente aconteceram, embaladas pela alegria da festa!

 Terminada a atividade, antes da meia-noite, ninguém deixou o local sem auxiliar de livre e espontânea vontade na limpeza do salão cultural. A sensação era de que todos queriam prolongar aquele bom momento. Nossos jovens deixaram o local na companhia dos pais e líderes, que estiveram presentes e participaram ativamente da festa o tempo todo. Não tinham de que se envergonhar, não precisavam se esconder para viver seus momentos de diversão. Podiam fazê-lo na presença de seus pais, certamente. Voltaram seguros para seus lares, sóbrios, garantindo também a segurança de outros com quem se depararam no trânsito. Levavam nos lábios o sorriso de quem sabe como é fácil ser feliz sem a necessidade de álcool ou drogas. Foi de fato uma noite linda, memorável!

 Formam um grupo pequeno, considerando os muitos que nesse momento estavam recém saindo para as baladas. Mas como me orgulho desse pequeno grupo! Estive com eles, sei que sua diversão foi genuína, real, e não algo forjado por substâncias alucinógenas. A alegria que sentiram permanece com eles, e animará seus próximos eventos. São jovens que guiam ao invés de seguirem cegamente os ditames da moda. São jovens nos quais deposito minha confiança de um futuro brilhante, pois serão os líderes dos meus filhos na igreja, e não duvido de que serão homens e mulheres de grande influência social onde estiverem. Pois tomam sobre si a responsabilidade de ‘fazer acontecer’, e fazem-no com elevados padrões de conduta.

Para mim, essa é a juventude da promessa. E eu confio nela!

Suzy Rhoden

Gravataí, 14 de setembro de 2011

terça-feira, 6 de setembro de 2011

Eu pratico corrida!


TAF Inspetor - Polícia Civil
Homenagem a minha colega de concurso, Karen Micheletto Rodrigues, em destaque na parte central  da imagem.

Mal se adivinha a primavera, graciosa e florida, e já estamos com os olhos fitos lá no verão, decidindo a tonalidade do loiro no cabelo, fazendo matrícula na academia e planejando quantos quilos eliminaremos para gozarmos mais plenamente – segundo nossa visão  anoréxica da vida – dos dias de sol e calor. Não fujo à regra, exceto pela cor do cabelo. Mas já tratei de voltar aos exercícios físicos. Em meu caso, não exatamente por questões estéticas, mas por exigências de minha futura profissão. E principalmente pelo prazer que encontro nessas atividades.

No princípio, não foi assim. Embora adepta de caminhadas, esporadicamente a hidroginástica ou a natação, não incluía de modo algum a corrida em minha lista de exercícios aeróbicos. Mesmo na academia, optava pela bicicleta e passava bem longe das esteiras. Em meus pensamentos, a corrida era apenas uma maneira chata de me cansar  bem rápido. E eu não gostava de coisas chatas, muito menos de coisas cansativas, tediosas.  

Até eu inventar de fazer um concurso público. Aprovada, avancei para a segunda fase, e dessa fui com excelência para a terceira: Teste de Aptidão Física. Dentre as atividades, a corrida destacava-se como o divisor de águas, capaz de aprovar ou reprovar um candidato. Não havia jeito, eu teria que encarar o tédio das esteiras.

Mas não por muito tempo! Achava o cúmulo correr no mesmo lugar, a despeito das explicações dos profissionais na área, afirmando que isso era necessário para que eu ganhasse resistência e condicionamento físico. Fui buscar esses atributos correndo nas ruas, nos parques arborizados, nas areias da praia, e em todo tipo de ambiente externo onde me encontrasse. Assim ganhava resistência, e em dias planejados impunha a velocidade necessária, dentro do tempo requerido pelo certame, nas pistas de corrida da Universidade Federal de Santa Maria. Exatamente assim nasceu em mim a versão feminina do inesquecível Forrest Gump: tornei-me uma apaixonada por corridas, e quanto mais corria mais queria correr!

Preciso dar os créditos ao meu brilhante Personal Trainer, que na qualidade de Assistente Social desempenhou muito  bem seu papel de treinador. Antes que alguém veja aqui ironia e desmereça o rapaz, repito que ele foi brilhante, incrível, o que justifica sua capacidade de atuação com sucesso em distintas áreas de formação. Sendo esse, inclusive, nosso ponto comum: sede de conhecimento em áreas opostas, fazendo com que, de tempos em tempos, mudemos completamente o rumo profissional de nossas vidas.

Viciei completamente na corrida. Descobri nessa habilidade o que chamo de ‘tesouro oculto’, pois é algo que eu não teria experimentado a não ser que existisse um motivo de ‘força maior’ para fazê-lo – um teste de aptidão física, por exemplo. Não imaginava que meu corpo, após três gestações e longos anos sedentários, estivesse tão preparado para a atividade física. A confirmação de meu condicionamento veio em consultório médico, durante teste ergométrico. Enquanto corria em aclive – e dessa vez não deu para fugir do tédio da esteira! –, percebia as expressões de surpresa do médico e de sua assistente, como se algo estivesse errado. Seria algum problema cardiovascular?! Não tinha tempo para perguntar, pois de 5 em 5 minutos a velocidade da esteira aumentava, e minha energia incrivelmente também!

Terminado o teste, o cardiologista desejou saber há quanto tempo sou maratonista. Eu ri da piada, pega de surpresa. Ele não, queria mesmo uma resposta! Disse que ‘desde nunca’, ao que ele replicou com nova pergunta: mas corria na escola, era da equipe de atletismo da universidade, praticou durante muitos anos algum esporte ou atividade aeróbica significativa? Diante de tantas negativas, ele só fez mencionar a palavra ‘impressionante’, realmente impressionado. E me informou, com seu laudo, que praticamente não houve alteração em meu batimento cardíaco e pressão arterial, como se meu corpo não sofresse com aquele esforço físico. Impressionada fiquei eu: quantas São Silvestres perdidas nesta vida!

O resultado do bom condicionamento veio no teste de aptidão física. Aprovada com nota máxima em todos eles, exceto no dinamômetro onde perdi um único ponto. A corrida foi a última prova, e também minha consagração. Corríamos em grupos de  aproximadamente 35 pessoas, mas não competíamos entre nós, bastava que cada um cumprisse a distância mínima para ser considerado apto. Do contrário, eu teria garantido a medalha de ouro: voei na pista! Corri muito além da distância máxima feminina, alcancei a mínima masculina, e fui adiante. Completei tantas voltas quantas me propus e ainda me permiti andar nos últimos segundos de prova, até ser zerado o cronômetro. Inexplicavelmente doce  o sabor da vitória, mas único e sem qualquer descrição o sabor de missão cumprida! Experimentei ambos nesse dia.

Então chegou o inverno gaúcho. A maratonista recolheu-se ao aconchego de seus aposentos e no que se refere a atividades físicas hibernou. Seria um retorno ao temido e devastador sedentarismo?! De jeito nenhum! Nada além das férias de inverno, necessárias para o corpo descansar. Voltei na semana passada aos treinos, mas amadora que ainda sou escolhi justamente a sexta-feira para correr! Foi perfeito, corri muito, como nos bons tempos do verão. Mas garanti a tortura sobre o salto no fim de semana e, segundo meu Assistente Social, digo, meu Personal Trainer, tenho ainda alguns dias de músculos doloridos pela frente.

Espero não me deparar, depois desta narrativa pessoal, com argumentos inconsistentes do tipo ‘detesto correr’. O sedentarismo definitivamente não se justifica. Não existem argumentos válidos. E se ainda assim faltar para alguns uma motivação extra para experimentar a corrida, sugiro concursos na área policial. Nunca se sabe exatamente onde que nosso ‘tesouro oculto’ de habilidades está escondido... Melhor ficarmos atentos a cada oportunidade!


Suzy Rhoden
Gravataí, 06 de setembro de 2011

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