segunda-feira, 19 de setembro de 2011

Nossa Cultura, Nossas Tradições



            

           

Não temos escolha, nascemos atrelados a ela pelo local de nosso nascimento. Mas se pudéssemos escolher, mudaríamos algo? Normalmente nossa cultura é tão enraizada, nossa tradição  firmemente estabelecida  desde o berço, que se torna parte de nós e nos identifica como indivíduos pertencentes a um grupo. Assim, sequer cogitaríamos a possibilidade de outro traço cultural, ainda que pudéssemos elegê-lo. Aceitamos nossa herança, passamos a fazer uso diário dela

Vejo com olhos positivos essa característica do ser humano. É importante termos uma identidade cultural, amarmos e defendermos aquilo que é tipicamente nosso – nosso povo, nossa terra, nossas tradições. Penso que aquele que não sabe valorizar o que é seu, não saberá jamais apreciar o que é do outro; será um crítico permanente de todas as manifestações culturais, ignorante e vazio de seu próprio conteúdo.

Venho de uma terra que serve como modelo nesse assunto. Ijuí, no noroeste do RS, promove anualmente a Festa Nacional da Cultura Diversificada, festejo que reúne representantes de 12 etnias colonizadoras da cidade e região. Ao longo dos dias de exposição, culturas diferentes dividem o mesmo palco, apresentando suas danças típicas em clima de total cordialidade e harmonia. Para quem deseja estender seu conhecimento à gastronomia de cada país, é possível, por exemplo, começar o dia com o famoso café vienense elaborado com apfestrudel (cuca recheada com maçã) e sachertort (torta de chocolate) na Casa Austríaca; almoçar a tradicional paella na Casa Espanhola ou quem sabe o vatapá da Casa Afro; degustar uma esfiha ao longo da tarde, enquanto aprecia a beleza da dança do ventre, típica da cultura Árabe; e ainda terminar a noite ao som das marchinhas alemãs, após ter saboreado o famoso chucrute. Perfeita convivência de muitas nações, distintas entre si. Fronteiras que se alcançam com uns poucos passos, de uma casa cultural a outra.

Porém, nem sempre é essa a cena que se vê: intolerância ergue muralhas, visíveis ou não, separando povos e culturas. Revela-se um outro tipo de ignorância, pior do que a daquele que nega suas raízes. É a ignorância do que realmente acredita na supremacia de sua cultura, demonstrando desprezo pela tradição alheia. Ao invés de exaltar seus costumes, ataca e deprecia a prática de outras regiões – como se houvesse a necessidade de uma cultura prevalecer sobre as demais, e como se isso realmente fosse possível!

Não precisamos ir ao exterior para encontrar exemplos de povos que não se entendem: de um estado para outro, dentro de nosso Brasil, são visíveis as diferenças. E nem todos sabem lidar bem com isso. Recebi, há algum tempo, mensagens insistentes em minha página de relacionamento, provenientes de um conterrâneo, apresentando conteúdo ofensivo ao povo paulista. As palavras usadas eram fortes, carregadas de ódio, e lançadas de forma generalizada sobre todos os habitantes de São Paulo - faziam lembrar um ataque terrorista de alguém que entra armado em local público, atirando para todos os lados. Um terrorismo em palavras. O propósito de tal disparate? Não entendi, nunca vou entender. Não há como explicar um absurdo.  Mas, por via das dúvidas, ‘terrorista’ e sua arma – as tais mensagens - foram banidos imediatamente de minha página.

Situação inversa vivi há alguns anos, quando então fui eu a vítima de comentário maldoso. A ‘terrorista’ da vez era uma jovem paulista, com a qual eu tinha acabado de travar conhecimento. Suas palavras traduziam seu desprezo pelo povo gaúcho. Apesar da situação constrangedora, considerei prudente ignorar sua observação naquele momento. Era óbvia a generalização baseada em experiência anterior, certamente desagradável, que ela tivera com algum conterrâneo meu – seria o ‘terrorista’?! Ponderadamente, escrevi um bilhete explicando que sou gaúcha, sim, que tenho muito amor por minha terra, sim, mas que não me responsabilizava por todos os gaúchos com os quais ela já tinha tido contato. Porém estava sinceramente disposta a conhecê-la e a respeitá-la em sua individualidade, e a convidava a fazer o mesmo, para então termos condições de expressar julgamento uma sobre a outra.  No encontro seguinte recebi um pedido de desculpas. E nos demais que se seguiram conheci uma de minhas mais queridas amigas. Para nós, foi-se para sempre a muralha que separava São Paulo e Rio Grande do Sul.

Considerando nossa natureza ‘bairrista’ e os exemplos citados, será possível expressar amor a nossa terra sem depreciarmos a cultura do outro? Certamente. Convivi durante algum tempo com uma jovem pernambucana, apaixonada por sua cidade, Recife. Falava, contudo, de maneira tão positiva que ao invés de criar em mim rejeição por seu estado, o que normalmente acontece nessas situações, vi desabrochar um desejo imenso de conhecer as belezas nordestinas! Terá sido coincidência eu vir a me casar com um gaúcho que morou por algum tempo justamente na cidade de Recife?

A exemplo dessa amiga querida, aproveito esta Semana Farroupilha para expressar meu amor pelos pampas onde cresci, tenho vivido, e sido muito feliz. Amo a vida gaudéria que meu estado me proporciona, sinto-me orgulhosa da riqueza de nossa cultura, da beleza de nossas danças típicas, da indumentária recatada e elegante que nos caracteriza – a pilcha. Temos no dia 20 de setembro o ‘precursor da liberdade’, conforme faz lembrar nosso hino. Celebramos nessa data o Dia do Gaúcho: um dia para relembrar a luta de outros tempos, e a tradição que não pode ser perdida ao longo dos anos. Dia para ser comemorado com churrasco e  ‘bebemorado’ com chimarrão, sorvido na roda de amigos, passando a cuia de mão em mão.

Essa é a minha identidade, a minha raiz, e para onde  for levarei comigo os traços dessa tradição que me acompanha: seja no sotaque,  nas expressões regionalistas ou nas minhas preferências gastronômicas. Eu sou do sul, é só olhar pra ver que eu sou do sul, conforme os versos de uma canção gauchesca que muito ouvimos por aqui. E isso dizemos com orgulho de nossa terra, com amor por este chão, mas sem a pretensão arrogante de afirmarmos supremacia.

Lembrando novamente que não me responsabilizo por todos os gaúchos com os quais meu leitor possa ter tido contato... Há sempre, em todos os estados e países, um terrorista das palavras disparando sua insanidade como se fosse metralhadora. É ele, o insensato, quem deve ser banido (no sentido de ignorado), e não a cultura ou o povo que ele eleva ou denigre.

Suzy Rhoden

Gravataí, 19 de setembro de 2011




       

5 comentários:

  1. Suzy, é tão bonito esse orgulho que você demonstra pela sua terra, um bairrismo sadio, inteligente,
    respeitando todas as outras culturas. Sempre acreditei que os gaúchos são os brasileiros que mais prezam pelos seus costumes regionais, é lindo isso!

    Beijos

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  2. Lindo esse texto e passa pelo orgulho dos gaúchos, e dos povos, mas o que pega mesmo é o que deve reinar: RESPEITO. Isso sim, em todas as circunstâncias e ocasiões.

    Aí podemos festejar !!! beijos,tudo de bom,chica

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  3. Oi, Suzy:

    É, amiga, este assunto do 'bairrismo' dos gaúchos é conhecido em todo o país. Por vezes elogiado, por outras... Porém os gaúchos são assim, a gauchada (da Argentina, Uruguai e Rio Grande do Sul) é uma coisa só, todos se sentem em casa. É a mesma cultura, a mesma tradição. É algo muito forte, pois vemos CTG abertos em vários partes do mundo – onde existem gaúchos, as tradições vão junto, o amor e a saudade dos rincões falam muito alto. A explicação? Não saberia te dar, apenas sei que sentes tanto quanto eu. Isso é tão maravilhoso, tão forte que penso que deveria existir com todos os Estados e todos deveriam respeitar, afinal falamos, cultivamos e amamos nossas raízes. A música gaúcha é linda, mas sentida e compreendida pelos gaúchos. Até o 'cusquinho' numa cavalgada faz falta, não?

    Porém, como narraste - e peguei muito bem o espírito da tua crônica, em certos lugares temos de dizer para nossos corações gritarem mais baixo, serem mais discretos para que não tomem nossos sentimentos como afronta e que somos brasileiros, acima de tudo. Amamos nosso país e nossa gente, nossos todos irmãos brasileiros. Nosso sangue é um só.

    Grande beijo.

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  4. Boa noite minha linda menina Suzy!
    Estou com saudades de vc no meu cantinho...
    Seu texto é muito interessante e lindo...eu que moro do outro lado,aqui na Paraiba,fico me imaginando na cultura de vcs,kkkkkkk
    Bjsssssss

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  5. Olá, Suzy...
    Eu sou Catarinense,heheh, mas Catarinense vem de tantas raízes, acredito que minha raiz esteja no Mar, eu sou do Mar. Uso o Mar como referência porque de família mesmo venho de muitas raízes além Mar e agrego todas, Adoro porque está em mim. Por parte de pai, meu sangue vem da Bélgica, país rico, por parte de mãe, Romênia, país pobre, discriminalizado pela União Européia, são dois contrapontos, mas eu nasci no Brasil que Amo tanto.
    E quer saber, tenho alma gaúcha, pois vivo indo para o Rio G. do Sul. Amos todos os Estados, muitos nem conheço ainda.
    Mas quando alguém pergunta, ou até mesmo eu me pergunto do que eu gosto. Respondo: do Mar e de Cavalgar nos pampas!
    Abraços carinhosos,

    Sapatinhos da Dorothy

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