segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Travessuras





Não sei se o Dia das Bruxas tem algo a ver com isso, fato é que minha caçulinha Sofia, 2 anos, aplicou-me uma de suas travessuras neste domingo: num piscar de olhos – e realmente não mais do que isso – ela desapareceu. Sofia é dessas crianças silenciosamente travessas, a espécie mais perigosa que existe! Não dão aviso prévio, nem qualquer sinal da arte planejada, fazendo-nos crer em sua completa absorção numa atividade. Basta um instante de vacilo, um flash de pensamento, para a pessoinha deslizar sem qualquer ruído rumo ao portal de aventuras que se abre diante de seus olhos, e ali desaparece.

Fiquei pensando a quem puxou essa criança... Filha de pai centrado e mãe muito calma, tranqüila e ponderada. Alguém acredita? Nem eu. Se travessura constasse na ficha policial, a minha seria quilométrica. Minha mãe descreve exatamente as mesmas características de Sofia em mim, nos meus longínquos 2 anos: perfeitamente ágil, rápida em manobras e, claro, adepta do silêncio dos profissionais. Pois travessura com barulho e estardalhaço é coisa de amador, não rende créditos ao travesso.

Uma de minhas primeiras ousadias, conforme relato materno, foi escalar as paredes do quarto do casal e me instalar sobre o alto roupeiro de meus pais. A casa, antiga, era feita de madeira, mas ainda assim é um  mistério como uma criança menor de 2 anos conseguiu tal proeza. Minha mãe tinha certeza de que eu estava no quarto, mas não podia me encontrar em lugar algum. Para seu chamado, a resposta era o silêncio. Eu já sabia falar, claro, mas que graça haveria em denunciar meu perfeito esconderijo? Não o fiz com o uso da palavra, mas fui traída (leia-se salva) pela providência divina: esbarrei na bíblia de minha mãe, lá em cima guardada, que desabou com estrondo revelando o meu segredo. Os olhos assustados de minha mãe pousaram então sobre uma menininha sorridente, que feliz parecia dizer: “Ok, você venceu o esconde-esconde desta vez. Mas me aguarde na próxima!”

Entre as peripécias mais lembradas por minha mãe estão as que datam da época em que eu, filha primogênita, recebi um irmãozinho. O quarto materno  se transformava em laboratório de experiências para mim diante da menor desatenção de minha mãe. Não queria fazer mal ao bebê, meu intuito era sempre o de cuidar dele tal qual cuidava de minhas bonecas. Assim, fui flagrada alimentando o pequenino numa ocasião; em outra, eu estava a medicá-lo com os remédios de minha mãe, obtidos graças a minha técnica de spider-girl. Por sorte, minha ação foi obstruída no momento em que eu me preparava para administrar a primeira dose. Mas o ato supremo de carinho foi minha mãe ter encontrado o berço móvel, de vime, onde o bebê dormia, em posição vertical, sendo que a criança estava com as pernas para o ar e eu a acariciá-la e beijá-la na face, que ficou a centímetros do chão.

Minhas aventuras preferidas, contudo, foram as vividas em companhia de meu cachorrinho Zumbi. Tínhamos a mesma idade e éramos grandes amigos. Ele era meu guia nas fugas freqüentes, me levava segura pelo vasto mundo proibido por papai e mamãe. Segura? Nada além de algumas lavouras e potreiros que atravessamos. Preciso confessar que alguns riachos também. Zumbi e eu tínhamos uma técnica infalível: assim que mamãe ouvia o choro do bebê e ia ao quarto para alimentá-lo,  nós íamos sem remorsos ao mundo para explorá-lo!

Eu seguia o cãozinho, onde quer que ele se metesse. Confiava integralmente nele, afinal era o cúmplice perfeito, aquele que jamais me trairia. Se corria perigos, não sabia. E se soubesse, não me importaria com eles. Queria fazer  minhas descobertas de criança, nasci com sede de aventura. Não me bastava o mundo limitado do quintal de casa, eu queria as emoções da viagem ao exterior – além dos campos e lavouras da família.

O cúmulo das fugas aconteceu quando ultrapassei os limites das terras vizinhas e cheguei a estrada principal, onde pelo menos uma vez por dia passava um carro – não apenas as habituais carroças ou o maquinário dos agricultores locais. Aquilo aos 2 anos era a triunfal descoberta de um novo planeta! Olhei extasiada para a rua que vinha, passava por mim, e seguia rumo ao infinito. Tal qual Neil Armstrong a pisar na lua uma década antes, aventurei meus passinhos pelo mundo mágico que se estendia a minha frente. E teria ido além, conquistado quem sabe até o sol, se não fosse interceptada por meu pai e seu olhar fatal de ‘jamais, JAMAIS tente isso novamente’. Se não sou hoje uma famosa cosmonauta como outras valentes Valentina’s, meu pai é o grande culpado. Imperdoável.

Sim, lembro bem da visão de uma criança travessa. Não existem obstáculos para ela. A lembrança desse fato me fez gelar diante do sumiço repentino de minha caçulinha. Teria ela ido desbravar a lua e os planetas sem fim?! Entendi perfeitamente os sentimentos de  minha mãe durante minhas fugas, a dor absurda, o medo da perda, o pânico que se instaura e os segundos que parecem eternos até reencontrar o pequeno aventureiro. Negligência? Talvez. Quem mandou, afinal, a mamãe exausta piscar os olhos?! Mas acima nos céus há um Pai Celestial atento que, como protegeu a mim no passado, garantiu meu reencontro quase imediato com minha travessa, sã e salva. Desvendei-lhe o esconderijo.

Em seu olhar, reconheci um familiar: “Ok, você venceu o esconde-esconde desta vez. MAS ME AGUARDE NA PRÓXIMA!”

Suzy Rhoden

Gravataí, 31 de outubro de 2011


terça-feira, 25 de outubro de 2011

Reféns do Medo




         Intimidados pelas tragédias diárias que chegam pela mídia aos nossos lares, temos desenvolvido uma série de fobias que não limitam unicamente nosso convívio social, mas verdadeiramente nos impedem de viver. Ou podemos chamar vida à clausura a qual estamos submetidos, dentro das quatro paredes de nossas casas, cercadas por grades, cercas elétricas e câmeras de todo tipo aliadas a última tecnologia para manter não os ladrões distantes de nós, mas nós distantes de tudo e de todos?

          Estar com minha família é minha prioridade máxima, mas faço questão de que essa seja uma escolha para alguns momentos preciosos de meus dias e não uma imposição devido à insegurança de estar na rua ou em qualquer lugar público, sujeita a assaltos e violências similares.

Infelizmente, estou exposta até mesmo quando levo meus filhos para a escola, próxima de casa, e, quando retorno, carrego a insegurança de tê-los deixado lá: não entrará, por acaso, algum aluno armado disparando contra todos?  Que garantias tenho de que eles não serão assediados por algum estranho até mesmo dentro do pátio, como várias vezes já se viu em instituições conceituadas? E os casos de agressão entre colegas, de bullying, de humilhação causada por algum professor frustrado com a profissão, que desconta seus dissabores sobre a parte mais frágil e indefesa?

A sensação de impotência é avassaladora, veneno diário para a mente  ansios. O que podemos fazer contra a violência, afinal? Ah, se nos visitasse a fada-madrinha! Pediríamos sem hesitar uma bolha bem grande para nossa família, com escola, hospital e shopping, ponto final. Melhor não ampliar o pedido, pra não colocar muita gente dentro da bolha... Onde existe o ser humano, existe o egoísmo, a ganância e portanto a violência também. Mas a bolha protetora não existe. Muito menos a fada-madrinha que vem fantasiar a realidade. E, ainda que nossa casa ganhe ares de bolha inacessível, a escola, o hospital e o shopping ficam do outro lado: o jeito é tomar coragem e sair para o fogo cruzado.

Não vou questionar os governantes, nem entrar na questão absurda da falta de segurança policial. Muito tem sido dito sobre isso, e eu assino embaixo. Poderiam, sim, amenizar nosso conflito diário: boto ou não boto a cara pra fora hoje?! E se eu levar um tiro, tipo bala perdida? Pois isso acontece a todo instante... Mas não, não vou falar agora sobre isso.

Quero falar do contraponto. Somos impotentes de fato diante da realidade violenta que nos cerca. Saímos vivos para o trabalho e não sabemos se retornaremos para nossos filhos. Já sabemos disso. Aliás, é só o que sabemos, pois a mídia não traz outra novidade além dessa: mais um assassinato mor motivo torpe, mais dois assaltos na saída do banco, mais três mortes no trânsito causado por motorista alcoolizado em alta velocidade, mais quatro seqüestros relâmpago, quando as vítimas entravam (ou saíam) da garagem de casa. E mais, muito mais violência. Escorre sangue da tela e nós suamos medo por cada um de nossos poros. Sinceramente, em que o medo nos será útil?

Claro que não quero ser uma alienada, desinformada de tudo que acontece ao meu redor. Mas quanta sabedoria nas palavras da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva em programa de televisão nesta manhã, quando elucidou que é preciso haver um contraponto para toda tragédia que é levada ao público: por que reforçar tanto o medo no ser humano, sem noticiar também os bons acontecimentos – que ainda existem! – neste vasto mundo? Por que a paz raramente vira notícia? A superação? Essa tendência ao trágico acaba por reforçar os sentimentos de medo e ansiedade no ser humano, muitas vezes evolui para uma projeção: já saímos de casa com a sensação de que algo muito ruim irá acontecer.

Se os noticiosos erram nesse sentido, também nós erramos na escolha da emissora para a qual vamos dar IBOPE. Confundimos sensacionalismo com necessidade de informação, e agimos como o urubu em busca do alimento do dia: a carniça dele é a nossa tragédia, caçada com o controle a mão, na mídia.  Lembro-me de minha mãe solicitando silêncio durante o almoço, hora em que, na rádio de sua preferência, eram transmitidas as notas de falecimento. Para mim, aquilo tinha outro nome: agouro. Isso lá é hora de falar dos mortos?! A sensação era tão ruim, que guardei a certeza de que não imporia a meus filhos a mesma refeição indigesta.

Acredito que a prática contínua – a busca por más notícias – instaura em nós um medo desenfreado. Tornamo-nos reféns. Ainda que não sejamos jamais assaltados ou que experimentemos  outras formas de violência, agimos como se tivéssemos sido e afetamos nossa qualidade de vida. A doutora Ana Beatriz, já mencionada neste texto, afirma a relevância de um mínimo de fé. Não é necessariamente uma questão de religião, mas que cada um acredite em algo, ao seu modo, além de si mesmo, ou então estará de fato desprotegido e refém do próprio pânico. Pois visto é que somos impotentes diante da violência gratuita. Acreditar em alguma forma de proteção – para mim, e  isso é uma questão pessoal, não existe outra proteção senão a divina – nos  dá a coragem necessária para continuarmos com nossos afazeres e garantirmos pelo menos relativa qualidade de vida.

Tenho minha fórmula para encarar a dura realidade, driblando o medo e a ansiedade: começo meus dias com uma oração, demonstrando minha fé na deidade, então visto a armadura da coragem e vou pra guerra, atravesso o fogo cruzado. Viver é preciso. Estou cercada da tecnologia, necessidade contra a violência, pois ser negligente não é vantagem pra ninguém. Mas paralisar? Passar meus dias na clausura? Não dá! Há muitos feridos lá fora, vítimas de todo tipo de maldade, esperando a rápida ação dos corajosos. E coragem nunca me faltou.

Suzy Rhoden
Gravataí, 25 de outubro de 2011


terça-feira, 18 de outubro de 2011

Brasil, País do Futebol...







Muitos ainda não sabem, mas da ginástica rítmica também. E da natação. Do tênis de mesa, não podemos esquecer. E do vôlei, claro!

Continuamos a ser o País do Futebol, certamente. Título conquistado com honra ao longo da história. Mas conquistas  em outros campos, literalmente, trouxeram merecida democracia esportiva a nossa nação. Agora somos o País do Futebol, vírgula, e uma lista de modalidades capazes de colocar a bandeira verde-amarela acima de todas, enquanto ecoa nosso hino pelos pans, mundiais e olimpíadas.

Esperei muito por esse dia. Nada contra o futebol, apreciado moderadamente por mim. Mas por que a hegemonia num país tão vasto? Há espaço para todos, deixemos os craques de outros times brilharem também.

E eles têm brilhado. Participam atualmente do Pan-Americano de Guadalajara, no México. O festival de medalhas de ouro, prata e bronze mostra a garra que tem esta nova geração, e a habilidade não somente com a bola, mas também com o arco e a fita como demonstrou a Seleção Brasileira de Conjunto da Ginástica Rítmica. Sou particularmente fascinada por esse misto de balé com  arte circense, numa prática desportiva digna de ser chamada de show da mais alta qualidade.

Justiça seja feita aos incomparáveis nadadores  nacionais, que têm garantido aos nossos dias acréscimos sucessivos do orgulho de sermos brasileiros, tantas as vitórias uma após a outra. E ainda, sinto-me na obrigação de mencionar o ‘grande’ Hugo Hoyama, mesatenista que colocou nesta semana o décimo ouro no peito em jogos Pan-Americanos. Podemos ou não apostar nesta nova geração de atletas?

Eles são, sim, merecedores de crédito, de patrocínio, do nosso incentivo. Assisti encantada à abertura dos jogos, mas não foram os incríveis efeitos especiais que roubaram de vez minha atenção: foi a alegria de nossa delegação, cantando, rindo, sambando o tempo todo. Transformaram aquele momento numa festa, como é típico do brasileiro fazer em qualquer situação. A formalidade não combina conosco enquanto povo. O que, porém, fez toda diferença pra mim é que aquela era uma festa de jovens saudáveis, livres de entorpecentes ou substâncias viciantes. Sua alegria era genuína e não uma ilusão promovida pela bebida. Esses eu paro pra aplaudir, sua performance é a única realmente capaz de me imobilizar diante da TV – coisa que ‘herói’ nenhum das muitas versões do Big Brother jamais conseguiu fazer.

Para quem pensa que esse autocontrole é exclusividade de seleção olímpica, informo que participei como líder, no último fim de semana, das Olimpíadas da ORM (Organização dos Rapazes e Moças) de minha igreja (A Igreja de Jesus Cristo dosSantos dos Últimos Dias). Falo deles, da minha Juventude da Promessa de outra crônica. Por maior amor que lhes tenha, não ousaria recomendá-los para a seleção, considerando seu desempenho... Há que se treinar muito ainda... Mas quem disse que perderam em alegria e animação? Deram um show de boa vontade ao participarem das atividades, agindo como gente grande em relação às regras: palavrão ou discussão em campo era sinônimo de expulsão.

 Autocontrole é algo que se aprende na prática, impulsividade não combina com verdadeiros desportistas. Um jovem que não consegue administrar as substâncias que ingere ou controlar as palavras que saem de sua boca, certamente falhará no rigor dos treinamentos e na diligência que define os campeões – nos campos e na vida.

Como se não bastasse a postura de verdadeiros atletas e o ânimo comparável ao da delegação brasileira neste Pan, surpreenderam seus líderes com a criação de nova modalidade na região: alguém já ouviu falar no esporte olímpico ‘torta na cara’? Pois é, o ‘esporte’ foi elevado à categoria olímpica, pelo menos aqui em Gravataí. Engana-se quem pensa que nossos jovens desportistas foram os únicos a praticá-lo: nós, líderes, fomos intimados a comparecer ao local de provas, para nossa total e absoluta surpresa! E, modéstia a parte, levantamos o estádio, tão grande era a torcida... Por nós? Não. Pela torta. Confesso que esse foi meu melhor retorno à adolescência dos últimos tempos.

E viva ao País do Futebol, mais democrático do que nunca! Que venham as novas modalidades, as novas gerações e uma nova consciência: campeão mesmo é quem administra seus impulsos, gerencia seu próprio corpo, e experimenta a alegria genuína. Venha ela dos esportes olímpicos ou de uma simples e inesquecível torta na cara.

Suzy Rhoden

Gravataí, 18 de outubro de 2011

quinta-feira, 13 de outubro de 2011

Professores: Artistas no Palco



Não importa a época escolhida, exceto na primeira infância: qualquer retrospecto de minha vida me levará ao mesmo local, a sala de aula. Inicialmente como aluna,  o que se estendeu dos 6 anos a idade adulta. Então me formei professora e a mudança que se deu foi unicamente na posição que eu ocupava dentro daquele mesmo espaço, passando  do fundo para a frente, como  alguém da platéia que de repente é convidado a subir ao palco e comandar o espetáculo.

Esta semana, que  celebra na teoria o Dia do Professor – visto que na prática pouco há para se comemorar – evoca uma série de lembranças em mim. Mergulho no baú do tempo e encontro intactos, embora um tanto amarelados pela passagem dos anos, os grandes acontecimentos de minha vida escolar.

Guardo poucas lembranças  do meu primeiro ano, sei que também foi o primeiro e único ano na escola da professora que me alfabetizou. E que ela era novata. Entendo perfeitamente as motivações da coitada para desaparecer da comunidade tão logo tenha encerrado o ano. Era uma humilde escola na zona rural, desprovida de recursos e de investimentos do governo. Distante até mesmo da vila onde passava o ônibus, não restava ao professor opção senão hospedar-se na casa de algum aluno durante a semana. Aceitavam a designação para o trabalho naquela região dois grupos de profissionais: os corajosos, em busca de aventura e novas experiências na carreira; e os desesperados por um emprego, iniciantes na trajetória profissional, que topam qualquer coisa até conseguirem algo melhor.  Caso da referida professora, que ao final do ano ou foi promovida para escola com acesso facilitado, ou mudou de profissão. Fato é que aprendi a ler e a escrever, e muito rápido! Mas minha lembrança da primeira professora nada tem a ver com a didática de sala de aula, e sim com a falta de psicologia infantil.

Formamos fila, após o intervalo, para retornarmos a sala de aula, e ali mesmo na fila ela nos deu  sermão memorável. Reclamava dos muitos bilhetes e cartões que recebia da gente, dizendo que não tinha mais onde guardá-los. Pediu que limitássemos nosso afeto por ela. Pelo menos, foi isso o que entendi. E obediente como eu era, foi o que fiz. Hoje sou mãe e professora, recebo bilhetes, cartões, flores, papel de bala, de bombom, chiclete, maçã, laranja e um longo etc de demonstrações de carinho. Recebo tudo. Jamais rejeito uma oferta espontânea de carinho. Se guardo cada mimo, não importa. Depois de recebidos, os presentes são meus e posso dar-lhes o fim que me parecer mais conveniente. Mas  rejeitá-los ou limitá-los, jamais. Essa foi a lição mais importante, deixada por minha amada – com restrições – primeira professora.

Então veio a segunda profe, como um anjo que cai do céu na vida da gente. Atenciosa, paciente, exigente na medida exata. E o mais importante: amava nossos cartões, sorria e agradecia com sinceridade! Minhas memórias  não alcançam seu desempenho em sala, mas guardam um momento de extrema sensibilidade, que em meus 7 anos presenciei: a mãe de uma colega veio a falecer exatamente no dia de  piquenique programado para toda escola. Estávamos reunidos com nossos brinquedos, na agitação típica dessas atividades, quando nossa professora se aproximou entristecida. Tinha uma das missões mais difíceis de sua vida a cumprir. Levou minha coleguinha Lucia para um canto reservado, pegou sua mão e olhando em seus olhos com ternura e profundo pesar, deu-lhe a trágica notícia. Não ouvi as palavras, mas li tudo nos olhos de ambas, que eu observava à distância, e o que vi foi dor quase insuportável nos olhos de uma, e empatia absoluta nos olhos de outra. Aprendi que as maiores lições de um professor geralmente dispensam o quadro-negro.

Essa professora, uma corajosa, ficou conosco até eu avançar da quarta para a quinta série e mudar de escola. Fez uma grande diferença em minha infância, pela pessoa que ela era. Acredito que meu amor pelos livros tem algo a ver com sua postura e pela magia que criava em torno da minúscula biblioteca. Era ali meu local preferido, meu mundo encantado. E ele certamente me foi apresentado por um mestre que o conhecia bem.

O Ensino Fundamental me leva para as aulas de Português e Literatura, sempre recheadas de criatividade. Na verdade, nossa sábia professora nos dava liberdade para a criação, e isso me fazia amar as aulas. Nunca esquecerei, por exemplo, da crise de risada durante a apresentação de  A Moreninha, de Joaquim Manuel de Macedo, cujo conteúdo traduzimos em letras de música. Muitos anos se passaram e ainda sou capaz de cantar ‘Augusto enganou as mulheres...’, no ritmo de Peace, Jimmy Cliff, sucesso do momento.

O Ensino Médio deixou todo tipo de lembranças. Havia um professor, que deveria ser o meu preferido, pois com ele recebi todos os 10,0 possíveis a um aluno. Excelente professor? Não. Excelente memória a minha, pois decorava cada vírgula dos conteúdos que ele ditava, e apenas ditava, sem qualquer explicação. Seguia o conteúdo uma lista de perguntas, facilmente respondidas com o texto, bastava reproduzi-lo. E assim era nas provas. Eu acertava tudo, pois memorizo textos facilmente. Mas aprender mesmo, só no último ano, quando trocamos de professor. Não sei como a competente substituta desse ‘mestre’ preguiçoso se virou para dar-nos um intensivo de 3 anos em 1, mas ela o fez, pois passei com honra em Biologia no vestibular.

Um acontecimento crucial desse período foi o flagra de minha professora de Matemática em meu namorado, quando ele escrevia meu nome na parede da sala. Coisa de adolescente apaixonado. A bronca estava garantida. Mas para minha surpresa o motivo da repreensão não foi o ato vândalo e sim a possibilidade de eu, enamorada,  interromper meus estudos e deixar de prestar vestibular em universidade federal, como todos me incentivavam a fazer. Ela foi enfática: “Não vá atrapalhar os estudos dessa menina, ela tem um futuro brilhante  pela frente!” Ele realmente não me atrapalhou, pobrezinho, pois no último dia de inscrições para o vestibular na Universidade Federal de Santa Maria lembrei das palavras da professora e efetuei minha inscrição. Alguns meses depois fiz as provas, fui aprovada, mudei de cidade, comecei o curso. E terminei o namoro.  Aprendi que um verdadeiro mestre olha para nosso potencial e nos ajuda a ver as asas em desenvolvimento, que ainda não sabemos usar sozinhos.

Meus bons professores prepararam-me para o vestibular e para a vida. Na época, só me interessava o conhecimento dos livros, e esse recebi, mesmo em escola pública, com competência suficiente para  ser admitida em universidade federal, sem a necessidade de cursinhos ou investimentos preparatórios. Outros tempos, claro, pois não vejo a mesma possibilidade para meus filhos. A preparação para a vida só percebo hoje, quando olho para  trás e vejo muitos valores compartilhados nas entrelinhas dos textos que interpretávamos.

Estudei e tornei-me professora, tendo muitos modelos para seguir e outros dos quais eu definitivamente queria ser distinta. Fui novata, como minha primeira professora, e certamente incorri em erros que foram corrigidos ao longo da carreira. Aos poucos, fui definindo meu perfil de educadora. Aperfeiçoei meus métodos, fundamentei minha didática. Ensinar tornou-se parte de minha missão pessoal e não apenas profissional, como algo que me realiza, me desafia e me encanta. Tal qual o artista que pisa no palco para o mesmo espetáculo pela centésima vez, e ainda assim sente a emoção daquele momento, é a minha apresentação em sala de aula. Sempre uma nova interpretação, das mesmas falas. 

Profissão linda, acima de todas, pois forma qualquer outra, e é inexplicavelmente desvalorizada. Infelizmente permite, pelas condições atuais de trabalho, que alguns dos melhores mestres busquem novas áreas onde empregar seu conhecimento. Aqueles que permanecem, ou se acomodam numa vida ranzinza e amargurada de quem trabalha muito e recebe pouco, o que explica – mas não justifica – a existência de professores mal-humorados e descontrolados por aí; ou se destacam, fazendo ainda mais e melhor do que lhes é requerido, encontrando na realização pessoal a motivação para a batalha injusta de cada dia.

Para esses, bravos representantes de uma categoria sofrida, desço humildemente do palco neste momento e volto a ser platéia: recebam  meu aplauso, professores!

Suzy Rhoden 
Gravataí, 13  de outubro de 2011

sábado, 8 de outubro de 2011

O Sábio Uso do Tempo




É engraçado. Até metade do ano, aproximadamente, o alvo de nossa fúria era o clima e suas intempéries. Quantas vezes reclamos do inverno inclemente, lastimamos as calorias que ele nos acrescentou, o bom humor que nos roubou e a liberdade que nos subtraiu? Como se fosse ele o responsável por nossas escolhas covardes, o ameaçador Monstro das Neves, capaz de nos amarrar, amordaçar e impor sua vontade. Agora, nesta época do ano, temos novo alvo, e é contra ele que lançamos nossos dardos inflamados: o tempo.

Quem nunca foi parado na rua por um sujeito que se dizia apressado e, contudo, abusou de nossos preciosos minutos com frases do tipo: “Que correria! Estou sem tempo para nada!”, “Que loucura, já é outubro! Daqui a pouco é Natal! Este ano voou...”, “Não vi este ano passar, e já estamos praticamente em dezembro!”? E segue a lista dos desavisados, apavorados com a velocidade do tempo, que, insistem em dizer, aumentou nesta metade do ano. Será?!

Não. O tempo segue seu curso, como sempre. Mas para alguns, até julho têm-se a impressão de se ter tempo de sobra... E tarefas se acumulam para a metade seguinte. Quando ela chega, que susto! Tanta coisa para fazer, e as mesmas 24h de sempre. A pessoa surta. E o surtado não se conforma sem espalhar seu pânico, sendo capaz de parar outros na rua para dar a notícia: Veja, agora, graças a mim, você também está atrasado para seu compromisso.

A ‘falta de tempo’ tornou-se comprovadamente a doença da sociedade moderna. Ela é real e atinge a todos. Confessemos: o surtado nos infectou. Voltamos para casa apavorados, com a sensação de o ano estar acabando e nada de útil termos feito, nenhuma realização significativa. Para curar a depressão causada pela falta de tempo, corremos então para as salas virtuais de bate-papo e ali choramos nosso drama, expomos nosso dilema, sendo rapidamente confortados com a idéia de que isso acontece com todos e que não devemos nos preocupar exageradamente, temos que aproveitar a vida fazendo aquilo de que gostamos. E voltamos ao ócio desavergonhadamente, até o encontro casual com o próximo surtado.

Em questão de tempo, é isso mesmo o que acontece: alguns se desesperam, outros se acomodam julgando-se impotentes diante das horas que passam. Poucos de fato se organizam, estabelecem prioridades e têm a coragem de eliminar de sua vida as distrações, verdadeiras parasitas que se alimentam de nossos segundos mais ricos e preciosos. Ian S. Ardern, líder eclesiástico, alertou-nos recentemente acerca dos ventos da procrastinação, que nos impelem de uma atividade desperdiçadora de tempo para outra. E aquilo que realmente importa vai ficando para quando não tivermos mais forças nem energia. Nesse momento é que surgem os estressados. Sabem que precisam dar conta daquela tarefa, ou administrar tal situação, porém não conseguem fazê-lo eficientemente, pressionados pelos prazos esgotados e emocionalmente fragilizados.

O problema das distrações é que elas não se apresentam de ‘cara lavada’ diante de nós. São dissimuladas e persuasivas. Em nenhum momento dão a entender seu vínculo com o ócio, o disfarce habitual é o de produtividade. Porém, ledo engano. Um exemplo clássico é a televisão. Quantas mães de família chegam exaustas do trabalho e se concedem o direito de assistir a novela, dizendo para si mesmas que merecem, que é seu único lazer. De lá saem perto da meia-noite, quando se encerra a última transmissão. Os filhos já dormindo, e ela nesse momento se culpando por nem sequer ter perguntado como foi a escola, não ter conseguido auxiliar nos temas e ainda ter a casa para organizar. No dia seguinte, a rotina é a mesma, pois é preciso saber o desfecho da cena de suspense que encerrou a novela no capítulo anterior. E o vício, disfarçado de entretenimento merecido, finca suas raízes.

Pior do que o exemplo clássico é o moderno: quantos de nós trabalhamos conectados na internet, interagindo as tardes inteiras nas redes sociais? Um olho no trabalho, outro na mensagem que chega. Meio da tarde, hora do lanche, mas não saímos do lugar sem antes atualizarmos nosso status: intervalo. Quando retornamos, mais alguns minutos são gastos para compartilhar a nova informação: voltei! E assim passa nosso dia, com o mundo inteiro sabendo quantas vezes tomamos água, enquanto trabalho se acumula sobre nossa mesa e estresse garantido se aloja em nossas mentes assoberbadas. Ninguém poderá dizer que estivemos ociosos, mas será que dormimos tranqüilos à noite, com a agradável sensação do dever cumprido, tendo a certeza de termos sido produtivos? Fazer algo ininterruptamente não é garantia de que algo realmente útil e importante foi feito.

Identificar as distrações que nos fazem perder tempo é o primeiro passo. Depois é preciso mudar aquele velho conceito de que o tempo é um cavalo veloz, passando por nós em disparada. Pensamos que o segredo é montar nele e utilizar as rédeas. Isso não existe, o tempo não altera ou diminui seu ritmo. O que chamamos de domínio do tempo, segundo o jornalista Jean-louis Servan-Schreiber, só pode querer dizer controle de nós mesmos em relação ao tempo: a capacidade de dominar coisas que nos roubam tempo precioso ao invés de sermos dominados por elas. E isso, em seu prólogo o escritor já enuncia, não se aprende na escola – bem como todas as coisas importantes da vida. A experiência, o esforço contínuo e a disposição real de sacrificar tudo que não é prioritário garantem o sucesso na área, e isso pode significar uma vida inteira de aprendizado e raros casos de mestria. Não ceder aos impulsos, portanto, é o segredo.

Lembro do dia em que fui solicitada a dar um treinamento no assunto – uso sábio do tempo – em Montes Claros, Minas Gerais. Quando me foi passada a palavra, pus-me a organizar papeis sobre a mesa, cuidar de detalhes, reler meus apontamentos, conduzindo minha platéia a semelhante desperdício de tempo: começaram a conversar, perderam o foco da reunião, distraídos de seu propósito ali. Percebi que o único impaciente era o líder que me havia incumbido do treinamento, então me dirigi a ele: Quanto tempo tenho para o treinamento? Ele educadamente, mas enfático, transmitiu a mensagem: 5 minutos a menos. Agradeci sua participação perfeitamente adequada em minha demonstração e tratei de mostrar que em 5 minutos desperdiçados muitas vezes se perde o foco e o propósito de uma reunião. E quem sabe até de uma existência.

Sendo o tempo a própria trama da vida, é sábio fazer uso consciente dele. Que bobagem atacá-lo com nossos murmúrios! Que tolice trocar o papel de protagonistas pelo de platéia passiva, permitindo que outros assumam o controle de nosso bem mais precioso. Precisamos gerenciá-lo nós mesmos, ocupando-nos zelosamente em nobres causas, substituindo aquilo que vicia pelo que edifica, especialmente em nossas merecidas horas de entretenimento. Para os que ainda estão confusos quanto ao seu aproveitamento pessoal do tempo, fica a dica de Jean de La Bruyère, clara e precisa:

“Os que usam mal o seu tempo são os primeiros a queixar-se de sua brevidade”.

Suzy Rhoden
Gravataí, 08 de outubro de 2011 

domingo, 2 de outubro de 2011

Maternidade: um chamado sagrado.



Os anos passam e acrescentam centímetros a eles, acréscimos que no dia-a-dia não vemos, ocupadas na árdua tarefa de sermos mães. Não somos desatentas, muito menos distraídas. Penso que não vemos porque não queremos ver mesmo. Mas aí chega aquele dia específico no ano, ditador, trazendo a lente de aumento que tanto rejeitamos, e obriga-nos a encarar a verdade: eles cresceram! Olhamos atônitas ora para o bebezinho que embalamos em nossos pensamentos, ora para o mocinho de olhos brilhantes à frente do painel que lhe deseja um Feliz Aniversário. Entre tantos super-heróis espalhados pela parede, ele é o único que conseguimos ver: o herói menino que de mulheres fez-nos nascer mães, acrescentando a nossa vida, a partir de então, uma aventura por dia. Afinal, como faz todo herói, ele nos salvou do mais perigoso de todos os vilões: o egoísmo, típico daqueles que não sabem o que é cuidar de alguém.

Meu super-herói completou seis anos hoje. Isso explica a nostalgia deste texto. Mas como, se ele nasceu ontem?! Sim, foi ontem mesmo. Ainda sinto o desconforto das últimas horas com ele na barriga, eu enorme e com fôlego reduzido, mas insistindo em fazer tudo como no primeiro mês e em andar longas distâncias. Afinal, estava decidida a trazer meu primogênito ao mundo em um parto normal. Esse era meu ideal de parto.

Mas quem disse que a mim cabia o ideal, o normal, o natural? Os nove meses de preparação física para o grande momento aquietaram-se diante da resistência de meu corpo em ceder passagem para o bebê que queria vir ao mundo, como se meu ventre desejasse retê-lo, guardá-lo ali. Depois de quase 24 horas de contrações e dores intensas, fui encaminhada ao bloco cirúrgico para um parto cesáreo, onde vi surgir, diante de meus olhos encantados, o menino mais lindo deste mundo: o meu menino! Como explicar a emoção de um momento desses? Momento em que passo a ser co-autora da criação, sendo capaz de gerar vida em mim e pelo poder da divindade ter o privilégio de trazê-la a este mundo. Nesse dia, minha compreensão da maternidade afirmou-se como a descrevo hoje: um chamado sagrado que ao mesmo tempo em que eleva a mãe aos céus, traz o reino celestial a terra através do pequenino rebento, numa perfeita comunhão de ambos os mundos.

O famoso ‘parece que foi ontem’ descreve bem os sentimentos de uma mãe a cada aniversário de seu herdeiro. O ‘Parabéns pra Você’ que ecoa pelo salão de festas encontra eco também no filme mental que só ela vê, e os seis anos então se desdobram em muitos até virarem eternidade: momentos felizes que se multiplicam, como se existissem desde sempre e permanecessem para sempre. Nenhum detalhe é esquecido pela mãe, nenhum sorriso ignorado, nenhum abraço compartilhado em vão. As mães lembram de tudo, ainda que não tenham encontrado tempo para atualizar seus diários; confiam nos registros inequívocos de seus corações. Pois coração de mãe nunca falha.

Considero a maternidade a expressão máxima do amor. Incluo aqui aquelas que não geraram dentro de si os seus filhos, impedidas de fazê-lo pelo funcionamento de seu organismo assim como o meu não me permitiu recepcionar meu primogênito por vias consideradas naturais. São mães da mesma forma se aceitaram de algum modo o chamado e se correspondem positivamente à grandeza de suas atribuições. A maternidade para mim é  prova irrefutável de que existe um Deus, um Senhor da vida, que nos ama a ponto de nos convidar, enquanto maridos e esposas, a participar de Seu plano eterno, dando-nos a oportunidade de criarmos e nos tornarmos responsáveis por aquela vida especial que geramos na carne. Isso para mim torna sagrado o poder da procriação, motivo pelo qual ele deve ser usado com cautela e responsabilidade.

Recebi meu primogênito com amor, mas ele não foi apenas amado: ele foi desejado, ansiosamente esperado. E assim que ele nasceu, desejamos dar-lhe um irmão. E depois, com alegria, nos preparamos para receber uma princesa em nosso lar. Fosse novamente um príncipe, haveria a mesma aceitação. Escolhemos a família que temos hoje e trabalhamos muito para mantê-la não apenas financeiramente, mas emocional e espiritualmente também. O estabelecimento de valores individuais e a formação de caráter fundamentado na integridade eu posso assegurar que são prioridade absoluta em meu lar.  

Por ter uma família composta por três crianças pequenas, frequentemente sou solicitada a dar explicações do tipo: são todos seus? Sim, são todos meus. Todos queridos, todos amados, todos desejados. Mas você consegue dar a eles tudo de que necessitam? Sim, estou me esforçando sinceramente para isso. O inquiridor, diante dessa resposta, imagina uma família bem-sucedida, e crianças felizardas cercadas de tudo que o dinheiro pode comprar. Mas está relacionado ao dinheiro o ‘tudo’ de que nossas crianças necessitam? Penso que aí está um grande e comum equívoco da sociedade moderna. Sacrificar impulsos, fazer economias em família, dizer não ao desejo de um filho não é um problema. É assim que eles aprendem a administrar seus bens, a substituir o imediatismo supérfluo pelo que mais importa em longo prazo, e especialmente é ouvindo um ‘não’ que eles aprendem a lidar com as frustrações da vida sem provocarem uma guerra no trânsito ou uma chacina na escola, pois saberão desde cedo e com o exemplo no lar que o mundo não gira ao seu redor e que a vida não lhes trará somente benefícios.

Os maiores valores da vida, e aqueles que realmente importam, não estão à venda. Tive nesta semana um excelente exemplo disso: meu aniversariante, pouco antes de seu sexto aniversário, perdeu mais um dentinho e  foi visitado pela fada do dente que bondosamente lhe deixou uma moeda de R$ 1,00. Sabemos o valor que essas moedas simbólicas adquirem para nossas crianças, contudo fomos surpreendidos com a atitude de nosso filho. Ele espontaneamente ofereceu sua moeda para completar o valor do presente de aniversário que  havia solicitado. Desejava contribuir, dando tudo que naquele momento possuía e que era realmente só seu. E ainda acrescentou algo que fez toda diferença para o grande homem de cinco anos que naquele momento ele se tornou: “Se você puder me dar esse presente, papai, eu ficarei muito feliz. Mas se não puder agora, quero que guarde minha moeda para ajudar a pagar o presente no próximo aniversário”. Ele sabe que às vezes nossa resposta é não para suas solicitações. Mas não duvida de nosso amor por causa disso. Ao contrário, isso faz com que ele valorize cada aquisição, faz com que deseje participar conscientemente delas. Preciso dizer que sua moeda de valor ínfimo completou exatamente o que faltava para a compra de seu presente? Ele fez a verdadeira conquista, com apenas R$ 1,00.

Tenho motivos para ser grata  pela escolha que fiz ao aceitar o chamado sagrado da maternidade. Não esperei até ter uma mansão, o carro dos meus sonhos e uma carreira internacionalmente conhecida. Para mim, a ordem de prioridade é outra. Estabeleci minha família e trouxe com alegria a este mundo os filhos que o Pai Celestial quis me dar, e ao lado dessa família maravilhosa tenho trabalhado para conquistar muitas coisas, menores porém do que aquela que já conquistei e que é a minha força motivadora.

Aos que perguntam se tenho condições de oferecer tudo aos meus filhos, visto que já são três, respondo com segurança neste momento: não, eles não têm à disposição tudo que desejam. Mas meu empenho é incessante em dar-lhes tudo de que necessitam. E isso significa amor, educação, e uma base moral e espiritual sobre a qual estarão estabelecidos para fazerem por si mesmos escolhas sensatas, sempre que a vida lhes fizer essa exigência.

Suzy Rhoden

Gravataí, 01 de outubro de 2011



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