terça-feira, 25 de outubro de 2011

Reféns do Medo




         Intimidados pelas tragédias diárias que chegam pela mídia aos nossos lares, temos desenvolvido uma série de fobias que não limitam unicamente nosso convívio social, mas verdadeiramente nos impedem de viver. Ou podemos chamar vida à clausura a qual estamos submetidos, dentro das quatro paredes de nossas casas, cercadas por grades, cercas elétricas e câmeras de todo tipo aliadas a última tecnologia para manter não os ladrões distantes de nós, mas nós distantes de tudo e de todos?

          Estar com minha família é minha prioridade máxima, mas faço questão de que essa seja uma escolha para alguns momentos preciosos de meus dias e não uma imposição devido à insegurança de estar na rua ou em qualquer lugar público, sujeita a assaltos e violências similares.

Infelizmente, estou exposta até mesmo quando levo meus filhos para a escola, próxima de casa, e, quando retorno, carrego a insegurança de tê-los deixado lá: não entrará, por acaso, algum aluno armado disparando contra todos?  Que garantias tenho de que eles não serão assediados por algum estranho até mesmo dentro do pátio, como várias vezes já se viu em instituições conceituadas? E os casos de agressão entre colegas, de bullying, de humilhação causada por algum professor frustrado com a profissão, que desconta seus dissabores sobre a parte mais frágil e indefesa?

A sensação de impotência é avassaladora, veneno diário para a mente  ansios. O que podemos fazer contra a violência, afinal? Ah, se nos visitasse a fada-madrinha! Pediríamos sem hesitar uma bolha bem grande para nossa família, com escola, hospital e shopping, ponto final. Melhor não ampliar o pedido, pra não colocar muita gente dentro da bolha... Onde existe o ser humano, existe o egoísmo, a ganância e portanto a violência também. Mas a bolha protetora não existe. Muito menos a fada-madrinha que vem fantasiar a realidade. E, ainda que nossa casa ganhe ares de bolha inacessível, a escola, o hospital e o shopping ficam do outro lado: o jeito é tomar coragem e sair para o fogo cruzado.

Não vou questionar os governantes, nem entrar na questão absurda da falta de segurança policial. Muito tem sido dito sobre isso, e eu assino embaixo. Poderiam, sim, amenizar nosso conflito diário: boto ou não boto a cara pra fora hoje?! E se eu levar um tiro, tipo bala perdida? Pois isso acontece a todo instante... Mas não, não vou falar agora sobre isso.

Quero falar do contraponto. Somos impotentes de fato diante da realidade violenta que nos cerca. Saímos vivos para o trabalho e não sabemos se retornaremos para nossos filhos. Já sabemos disso. Aliás, é só o que sabemos, pois a mídia não traz outra novidade além dessa: mais um assassinato mor motivo torpe, mais dois assaltos na saída do banco, mais três mortes no trânsito causado por motorista alcoolizado em alta velocidade, mais quatro seqüestros relâmpago, quando as vítimas entravam (ou saíam) da garagem de casa. E mais, muito mais violência. Escorre sangue da tela e nós suamos medo por cada um de nossos poros. Sinceramente, em que o medo nos será útil?

Claro que não quero ser uma alienada, desinformada de tudo que acontece ao meu redor. Mas quanta sabedoria nas palavras da psiquiatra Ana Beatriz Barbosa Silva em programa de televisão nesta manhã, quando elucidou que é preciso haver um contraponto para toda tragédia que é levada ao público: por que reforçar tanto o medo no ser humano, sem noticiar também os bons acontecimentos – que ainda existem! – neste vasto mundo? Por que a paz raramente vira notícia? A superação? Essa tendência ao trágico acaba por reforçar os sentimentos de medo e ansiedade no ser humano, muitas vezes evolui para uma projeção: já saímos de casa com a sensação de que algo muito ruim irá acontecer.

Se os noticiosos erram nesse sentido, também nós erramos na escolha da emissora para a qual vamos dar IBOPE. Confundimos sensacionalismo com necessidade de informação, e agimos como o urubu em busca do alimento do dia: a carniça dele é a nossa tragédia, caçada com o controle a mão, na mídia.  Lembro-me de minha mãe solicitando silêncio durante o almoço, hora em que, na rádio de sua preferência, eram transmitidas as notas de falecimento. Para mim, aquilo tinha outro nome: agouro. Isso lá é hora de falar dos mortos?! A sensação era tão ruim, que guardei a certeza de que não imporia a meus filhos a mesma refeição indigesta.

Acredito que a prática contínua – a busca por más notícias – instaura em nós um medo desenfreado. Tornamo-nos reféns. Ainda que não sejamos jamais assaltados ou que experimentemos  outras formas de violência, agimos como se tivéssemos sido e afetamos nossa qualidade de vida. A doutora Ana Beatriz, já mencionada neste texto, afirma a relevância de um mínimo de fé. Não é necessariamente uma questão de religião, mas que cada um acredite em algo, ao seu modo, além de si mesmo, ou então estará de fato desprotegido e refém do próprio pânico. Pois visto é que somos impotentes diante da violência gratuita. Acreditar em alguma forma de proteção – para mim, e  isso é uma questão pessoal, não existe outra proteção senão a divina – nos  dá a coragem necessária para continuarmos com nossos afazeres e garantirmos pelo menos relativa qualidade de vida.

Tenho minha fórmula para encarar a dura realidade, driblando o medo e a ansiedade: começo meus dias com uma oração, demonstrando minha fé na deidade, então visto a armadura da coragem e vou pra guerra, atravesso o fogo cruzado. Viver é preciso. Estou cercada da tecnologia, necessidade contra a violência, pois ser negligente não é vantagem pra ninguém. Mas paralisar? Passar meus dias na clausura? Não dá! Há muitos feridos lá fora, vítimas de todo tipo de maldade, esperando a rápida ação dos corajosos. E coragem nunca me faltou.

Suzy Rhoden
Gravataí, 25 de outubro de 2011


6 comentários:

  1. Báh, Suzy, cheguei ao final da crônica meio encucada! Mas não do seu texto e sim de que nada sobrou para comentar. Cada parágrafo abordado por você é o que eu desejava dizer. A mídia resolveu, há muitos anos extrapolar; é o assunto preferido: crimes, sangue, crueldade, arrombamentos, sequestros. E dorme-se com isso. E quando não ouvimos ainda tudo, vêm as doenças, e bem na hora das refeições - ou mais tarde, para perdermos o sono. Notícia alegrinha? É raro. Mas a mídia leva ao povo o que o povo quer ver, você já percebeu? A solução é optar pelos canais fechados, onde podemos ver História, músicas, entrevistas, cultura em geral. E sair de casa?
    Pois é, as bolsas diminuíram de tamanho, as roupas ficaram mais simples, sem joias, sem nada que chame atenção. E não adianta, amiga, estamos com a síndrome do pânico, meio neurotizados, muito desconfiados com tudo.
    E o pior é que ainda falamos dos horrores da Idade Média!!

    Beijão, como sempre, perfeita!
    Tais Luso

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  2. Oi Suzy, você retratou de forma muito adequada essa questão. Ultimamente tenho parado pouco tempo em frente à tv e quando isso acontece procuro canais que não sejam muito sensacionalistas, afinal só aumentam ainda mais a angústia diante de tanta violência. Essa não é uma forma de fugir da realidade, como muitos acham,apenas um jeito de não ficar com os miolos derretidos diante das infinitas notícias cruéis de todos os dias.
    Agradeço a Deus por morar numa diminuta cidade onde ainda posso contar com muita tranquilidade.

    Beijos

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  3. Tens toda razão,Suzy! Além das notícias não nos darem trégua ,exaltando sempre o mal e as tragédias, ao andar na ruas estamos temerosas sempre, de verdade!

    Que pena!!!

    Liberdade de ir e vir??/Nenhuma segurança temos pra ela!!! um beijo,tudo de bom,chica (amanhã é a cirurgia de meu marido...Imagina como estou!)

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  4. Perfeita tua cronica!!

    Vicemos na era da insegurança.

    fazer o que?
    triste realidade..mas nao podemosnos paralizar diante disso.

    O medo de certa forma protege..mas nao pode nos aprisionar.

    bj

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  5. Eu creio que a fé é o maior e o melhor escudo para os perigos da vida!
    Se formos pensar cruamente, nem sairíamos nas ruas...Mas com fé e confiança na proteção Divina, podemos seguir confiantes que nada de mal nos acontecerá! Sou testemunha disto!

    Estou te seguindo e te convidando pra uma visita ao meu blog que hoje comemora 2 anos...

    Hoje é dia de festa e você é convidado: http://marciagrega.blogspot.com/2011/10/hoje-e-dia-de-festa-aqui-no-blog.html

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