segunda-feira, 31 de outubro de 2011

Travessuras





Não sei se o Dia das Bruxas tem algo a ver com isso, fato é que minha caçulinha Sofia, 2 anos, aplicou-me uma de suas travessuras neste domingo: num piscar de olhos – e realmente não mais do que isso – ela desapareceu. Sofia é dessas crianças silenciosamente travessas, a espécie mais perigosa que existe! Não dão aviso prévio, nem qualquer sinal da arte planejada, fazendo-nos crer em sua completa absorção numa atividade. Basta um instante de vacilo, um flash de pensamento, para a pessoinha deslizar sem qualquer ruído rumo ao portal de aventuras que se abre diante de seus olhos, e ali desaparece.

Fiquei pensando a quem puxou essa criança... Filha de pai centrado e mãe muito calma, tranqüila e ponderada. Alguém acredita? Nem eu. Se travessura constasse na ficha policial, a minha seria quilométrica. Minha mãe descreve exatamente as mesmas características de Sofia em mim, nos meus longínquos 2 anos: perfeitamente ágil, rápida em manobras e, claro, adepta do silêncio dos profissionais. Pois travessura com barulho e estardalhaço é coisa de amador, não rende créditos ao travesso.

Uma de minhas primeiras ousadias, conforme relato materno, foi escalar as paredes do quarto do casal e me instalar sobre o alto roupeiro de meus pais. A casa, antiga, era feita de madeira, mas ainda assim é um  mistério como uma criança menor de 2 anos conseguiu tal proeza. Minha mãe tinha certeza de que eu estava no quarto, mas não podia me encontrar em lugar algum. Para seu chamado, a resposta era o silêncio. Eu já sabia falar, claro, mas que graça haveria em denunciar meu perfeito esconderijo? Não o fiz com o uso da palavra, mas fui traída (leia-se salva) pela providência divina: esbarrei na bíblia de minha mãe, lá em cima guardada, que desabou com estrondo revelando o meu segredo. Os olhos assustados de minha mãe pousaram então sobre uma menininha sorridente, que feliz parecia dizer: “Ok, você venceu o esconde-esconde desta vez. Mas me aguarde na próxima!”

Entre as peripécias mais lembradas por minha mãe estão as que datam da época em que eu, filha primogênita, recebi um irmãozinho. O quarto materno  se transformava em laboratório de experiências para mim diante da menor desatenção de minha mãe. Não queria fazer mal ao bebê, meu intuito era sempre o de cuidar dele tal qual cuidava de minhas bonecas. Assim, fui flagrada alimentando o pequenino numa ocasião; em outra, eu estava a medicá-lo com os remédios de minha mãe, obtidos graças a minha técnica de spider-girl. Por sorte, minha ação foi obstruída no momento em que eu me preparava para administrar a primeira dose. Mas o ato supremo de carinho foi minha mãe ter encontrado o berço móvel, de vime, onde o bebê dormia, em posição vertical, sendo que a criança estava com as pernas para o ar e eu a acariciá-la e beijá-la na face, que ficou a centímetros do chão.

Minhas aventuras preferidas, contudo, foram as vividas em companhia de meu cachorrinho Zumbi. Tínhamos a mesma idade e éramos grandes amigos. Ele era meu guia nas fugas freqüentes, me levava segura pelo vasto mundo proibido por papai e mamãe. Segura? Nada além de algumas lavouras e potreiros que atravessamos. Preciso confessar que alguns riachos também. Zumbi e eu tínhamos uma técnica infalível: assim que mamãe ouvia o choro do bebê e ia ao quarto para alimentá-lo,  nós íamos sem remorsos ao mundo para explorá-lo!

Eu seguia o cãozinho, onde quer que ele se metesse. Confiava integralmente nele, afinal era o cúmplice perfeito, aquele que jamais me trairia. Se corria perigos, não sabia. E se soubesse, não me importaria com eles. Queria fazer  minhas descobertas de criança, nasci com sede de aventura. Não me bastava o mundo limitado do quintal de casa, eu queria as emoções da viagem ao exterior – além dos campos e lavouras da família.

O cúmulo das fugas aconteceu quando ultrapassei os limites das terras vizinhas e cheguei a estrada principal, onde pelo menos uma vez por dia passava um carro – não apenas as habituais carroças ou o maquinário dos agricultores locais. Aquilo aos 2 anos era a triunfal descoberta de um novo planeta! Olhei extasiada para a rua que vinha, passava por mim, e seguia rumo ao infinito. Tal qual Neil Armstrong a pisar na lua uma década antes, aventurei meus passinhos pelo mundo mágico que se estendia a minha frente. E teria ido além, conquistado quem sabe até o sol, se não fosse interceptada por meu pai e seu olhar fatal de ‘jamais, JAMAIS tente isso novamente’. Se não sou hoje uma famosa cosmonauta como outras valentes Valentina’s, meu pai é o grande culpado. Imperdoável.

Sim, lembro bem da visão de uma criança travessa. Não existem obstáculos para ela. A lembrança desse fato me fez gelar diante do sumiço repentino de minha caçulinha. Teria ela ido desbravar a lua e os planetas sem fim?! Entendi perfeitamente os sentimentos de  minha mãe durante minhas fugas, a dor absurda, o medo da perda, o pânico que se instaura e os segundos que parecem eternos até reencontrar o pequeno aventureiro. Negligência? Talvez. Quem mandou, afinal, a mamãe exausta piscar os olhos?! Mas acima nos céus há um Pai Celestial atento que, como protegeu a mim no passado, garantiu meu reencontro quase imediato com minha travessa, sã e salva. Desvendei-lhe o esconderijo.

Em seu olhar, reconheci um familiar: “Ok, você venceu o esconde-esconde desta vez. MAS ME AGUARDE NA PRÓXIMA!”

Suzy Rhoden

Gravataí, 31 de outubro de 2011


9 comentários:

  1. rsss...Que coisa boa de ler!!!travessuras fazem parte de nossas vidas,não?

    Eu também aprontei muiiito e paguei na mesma moeda, com meus 4 filhos: Um dizia mata outro, enforca!!Assim, unidos, aprontavam tooodas e mais um pouco...Imagina a gang: 4 em 5 anos, numa linda escadinha!!!

    Portanto, te prepara com tua Sofia,rsrs

    Que bom que a achaste bem!!!beijos,tudo de bom,chica

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  2. Uma delicia de ler .. amei...

    Eu ja aprontei muito na minha infancia.. e confesso..levei belas palmadas..e sobrevivi..rsrs


    O melhor estar por vir..rs se prepara rs

    Um beijo....

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  3. Oi, Suzy...

    Que Bela Narrativa!
    Sem dúvida, sua pequena tem seu DNA...hehehe
    Mas é gostoso nos reconhecermos em nossos Amados "pedaços de nós"...
    Um beijo,

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  4. Suzi... rrs, você ainda não viu nada, amiga!! Deixa a mimosa crescer mais um pouquinho. Bem que eu aprontava um monte, e a minha menor - hoje adulta - foi tipo santinha. Quem me deu mais trabalho foi o meu filho! Esse sim, quase me matou. rsrs

    Eu adorava tocar as campainhas dos apartamentos e sair correndo e ficar ouvindo: quem é?????? Me divertia com estas coisas, eu e minha turminha.

    Adorava fazer bolo de barro, coberto de leite condensado e granulado e oferecer para o nosso jardineiro, o coitado do seu Silva!! Comia e pedia mais, adorava!

    Bem, amiga, hoje sou comportada, estou falando de infância!!!

    beijo grande, e vá se preparando...

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  5. Suzy, sou apaixonada pelas lembranças da infância e quando tão bem narradas como as suas, melhor ainda!
    Acredita que não tenho travessura alguma para contar dos meus tempos de menina? não fui um anjo de criança, mas também não era de aprontar muito.
    E lhe digo, você tem mesmo que ficar de olho na sua filhota, ela tem a quem puxar.

    Beijos

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  6. Que delícia recordar essas travessuras!!!
    Amei o teu blog, Suzy!!!
    Beijos meus!

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  7. Suzy,
    essas travessuras ficam guardadas para sempre em nossos corações, adorei. Obrigada por seu carinho no Delírio da Bruxa.
    Um beijo
    Denise

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  8. Susy, que super divertido ler tuas travessuras sua danadinha rsrs!!

    Mas criança pra valer tem que cometer essas artimanhas, e o melhor da festa é que essas coisinhas pequerruchas não têm medo de nada.

    Mas como disseste, tem um Pai Celestial que tudo vê, tudo cuida!

    Te prepara com tua pekena Sofia, muitas travessuras com gostosuras ainda virão. E depois que ela crescer, tudo ficará escrito na história de vocês e irão se lembrar com risos e saudades!

    Adorei a visita no Escritos, minha linda. E obrigadíssima pelas gentis palavras que deixou pra mim.

    bacios caríssima:D

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  9. Voltei pra agradecer o carinho e desejar um lindo fds!beijos,chica

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