Há alguns dias, uma
amiga compartilhava comigo, sem muita empolgação, o programa de seu fim de
semana. Passara o dia numa mansão, ora mergulhando na gigantesca piscina, ora
desfrutando do jardim impecavelmente bem cuidado. Para o almoço, fora servido
um banquete, seguido de deliciosas sobremesas e lanches saborosos ao longo da
tarde. Perguntei de que ela reclamava, afinal! Pois tivera o final de semana
dos sonhos de qualquer mortal. Não entendia a falta de entusiasmo em seu
relato... Ela então desabafou: pretendia visitar uma amiga querida, passar o
dia com ela e não com seus bens materiais. A anfitriã, porém, na ânsia por bem
servir, ocupou-se o dia inteiro com os detalhes práticos da recepção. Ofereceu tudo menos o que a convidada mais queria: companhia.
Não pude evitar a
comparação com a história bíblica das irmãs Marta e Maria, na ocasião em que
receberam Jesus Cristo em sua casa. A primeira, “andava distraída com muitos serviços”, enquanto que a segunda
assentou-se aos pés do Salvador para ouvi-lo. Naturalmente, Marta tinha as
melhores intenções, queria oferecer inquestionável recepção ao convidado. Com
esse pensamento, criticou a atitude da irmã, solicitando ajuda em seus
afazeres. Reveladora foi a resposta de Jesus para essa situação: “Marta, Marta, estás ansiosa e preocupada com
muitas coisas, mas uma só é necessária. E Maria escolheu a boa parte, a qual
não lhe será tirada” (Lucas 10: 41-42).
Antes de apontar o
dedo para Marta, voltemos no tempo: quantas vezes agimos exatamente da mesma maneira? Recebemos
um amigo em nossa casa e nos empenhamos em garantir-lhe o melhor cardápio, a
melhor hospedagem, no melhor quarto que possuímos. Apenas esquecemos de ouvi-lo. E no dia seguinte ele se foi,
carregando no peito o mesmo dilema com o qual nos procurou. Oferecemos o melhor, mas não aquilo que ele
precisava.
Ou então agimos
como a Marta inquieta no fim de semana reservado para a família. Acompanhamos
o filho no jogo da escola, mas apenas de corpo presente. O pensamento está bem
longe, preso aos problemas do escritório. Quantos gols mesmo ele fez? Que pena,
para a vida não há replay! Perdemos
não apenas um grande lance do jogo, mas um momento específico da vida dele que
nem as melhores fotografias trarão de volta.
Nossos momentos de
Marta não se restringem a vivência familiar e ao círculo de amigos, basta
pensar na Páscoa que acabamos de celebrar: quantos ovos compartilhados? Vários,
de todos os sabores e tamanhos. Como fomos ensinados na escola, representam a
renovação, etc, etc. Sinceramente, o que o chocolate tem a ver com a
ressurreição de Jesus Cristo?! Pois na data especial, quem visita nossa casa é
o coelho e não Aquele que expiou por nossos pecados e nos deu a chance de vida
eterna e plenitude da alegria. Paramos pra ouvir o Salvador no fim de semana
sagrado? Provavelmente estivemos ocupados com muitos serviços, nem sequer
notamos Sua presença e as bênçãos que a dádiva de Sua ressurreição acrescentam
a nossa vida diária.
Tal como Marta,
fazemos escolhas que consideramos boas. Mas serão as melhores e as mais
excelentes para aquele momento? Tenho me preocupado muito com isso ultimamente,
com o sábio uso de meu tempo. Avalio com cautela as atividades nas quais me
envolvo, para ter certeza de que trarão recompensa duradoura. Procuro entender
a necessidade real de um amigo – se lhe falta alimento para o corpo ou alimento
para a alma – antes de me lançar em tarefas que somente me ocuparão, sem
edificar de fato a nenhum de nós dois.
Posso dizer que a
esta altura de minha vida pouco me importam as mansões, as piscinas, os jardins
bem-cuidados, se neles eu tiver que ficar só. Dispenso banquetes servidos
somente para agradar, afirmo que pipocas de microondas acompanhadas de boas
risadas tem muito mais valor e sabor. Entendo a motivação das Martas, mas
declaro que gosto mesmo é das Marias – essas sim fazem uma falta enorme no
universo! Estão, porém, em extinção. Devem ter sido atropeladas pelo mundo
moderno e competitivo, sendo facilmente absorvidas pelas Martas atarefadas da
vida.
Nosso tempo é
precioso, merece ser bem aproveitado. Mas não é na quantidade de tarefas
diárias que ele poderá ser medido. Escolher a
boa parte requer sabedoria, discernimento; requer algumas tardes apenas
ouvindo... Mas quem tem tempo para isso? Ninguém. Ninguém tem tempo para ser
sábio em nossos dias.
Suzy Rhoden
bom texto susy, gostei. gostei do seu espaço também. saber escolher é uma arte da vida. grande abraço lamarque
ResponderExcluirVivi tempos de Marta e tempos de Maria e felizmente tive tempo suficiente para fazer a boa escolha...da casa bagunçada e do riso solto...do bolo queimado e da conversa animada e todo dia reavalio minhas escolhas para saber se são a boa parte,se trazem o melhor de mim pois sou "responsavel por todos que cativo"...
ResponderExcluirSuzy, querida, fantástica a sua crônica! Mandou o seu recado belamente citando essa passagem bíblica sobre Marta e Maria, onde Jesus salienta a importância de agirmos com sabedoria ao fazermos escolhas nas nossas vidas. Jesus sabia que nossa genuína felicidade só poderia vir do discernimento do que é duradouro e do que é passageiro.
ResponderExcluirQuando recebemos os amigos em nossa casa, o almoço, o lanche deve ser apenas o pretexto para estarmos juntos. Nada pode substituir o bom papo, boas risadas, companheirismo... Percebo que isso tem se perdido, as pessoas não tem tempo para parar e se dedicar aos outros, pois as tarefas ‘urgentes’ não podem ficar para o dia seguinte. É o corre-corre da vida moderna que não nos permite fazer escolhas sábias, o dever assume o primeiro lugar, sempre! Com isso ocorre o isolamento. Nunca vi tantas pessoas solitárias como tenho visto: um paradoxo na era da internet onde nos comunicamos com o mundo...Talvez seja esse o ‘x’ da questão: a ilusão de que estamos vivendo em sociedade. Mas é tudo tão superficial, raso.
Sua crônica veio de encontro ao momento que estou vivendo de retomar velhos hábitos que, sem me dar conta, tinham ficado lá atrás. Disponibilizar tempo ‘com qualidade’ para estar com meus amigos tem sido minha meta ultimamente. O que realmente é de valor não pode ser substituído.
Bjo grande amiga querida, linda semana pra vc!
Ps.: Muuuuuito felizzzz essa semana!!! Expectativa... Mais dois dias e saberemos o sexo do bebê da minha filhota!!! Mal posso esperar, ando tão bobona... rindo à toa rsrs... + bjos!
Suzy,esse é um daqueles textos que todos deveríamos guardar para não esquecer o maravilhoso conteúdo. Você colocou tão bem essa questão, na correria do dia a dia, ouvir atenciosamente é uma raridade, tanta gente preocupada com banalidades.
ResponderExcluirOutro dia fiquei imensamente triste ao reencontrar, numa cidade vizinha, uma amiga de infância, ao invés de me falar dos seus pais, filhos, da família enfim, ela se desdobrou em relatar os bens materiais que possuía e da farta conta bancária. Fui para casa pensando na pobreza em que aquela criatura vivia,pois nenhum valor ético, moral ou espiritual aparentava possuir.
O mundo carece, cada vez mais, de gente de conteúdo!
Uma linda terça-feira para você minha querida.
Beijos
Olá Suzy :)
ResponderExcluirBelo texto reflexivo...
Para a vida não há replay mesmo,então,o mais sensato é aproveitar com sapiência cada segundo.
Mas é raridade alguém que saiba escolher e usufruir 'a boa parte',pois conforme vc tão bem lembrou:
'Ninguém tem tempo para ser sábio em nossos dias.'
Bjs!
Suzy, que assunto palpitante que você aborda! Acho que receber alguém dentro de uma simplicidade e de uma amizade não interessa muito, né?
ResponderExcluirAs pessoas parecem que querem mostrar alguma coisa de concreto: o jogo de chá ou do almoço, a casa confortável, a piscina... As coisas! Mostrar o tanto que evoluíram materialmente; o tanto de atividades que seus filhos têm; o tanto que o marido trabalha e ganha. É um absurdo esta necessidade de mostrar-se mais rica.
É lógico que comer pipoca e trocar um papo legal é muito mais gostoso; é sentir-se prestigiada e querida. Sem muitos fru-frus.
É bom ficarmos com a sensação de que a pessoa nos recebeu com o maior carinho e prazer. Que gostou da companhia.
Você já imaginou, ao sairmos, a pessoa sentir um alívio por tanto trabalho?
Esse seu texto serve como um alerta: ir ao encontro de uma amiga é para conversar, colocar a 'matéria em dia'... Ouvir e ser ouvida, participar da vida uma da outra.
Você foi feliz nesta abordagem. Acho que certas atitudes - hoje - são meio bregas. Nada melhor do que uma pipoquinha básica e uma amizade sincera.
Beijão grande.
tais
Sensacionalk tua reflexão.. De nada adianta estarmos rodeados de luxo, de boas comidas, de prato=s finos ,até pratarias ,se não houver o clima de informalidade e amizade, onde o carinho nos faz querer ouvir o que o outro tem a nos falar e nós também podermos trocar idéias.
ResponderExcluirMas acontece muito mesmo isso! Lindo te ler! beijos,chica
Suzy,
ResponderExcluirEsses valores esquecidos e que são os nossos grandes tesouros deveriam estar guardados em nossos corações. Muito bonito seu texto e suas palavras.
Um beijo
Denise