quinta-feira, 17 de julho de 2014

Dor Convertida em Amor

Arte: Marci Oleszkiewicz
O que dizer a uma mãe que teve de sua princesa arrancada a virtude, maculada a pureza sublime da infância? Alguma palavra, qualquer que fosse, teria sentido?

Não tive a intenção de reabrir a ferida, jamais cicatrizada, porém disfarçada pelo passar dos dias e escondida da própria filha, a vítima imediata da monstruosidade. Mas precisei tocar no assunto.

Chorava sozinha, nas noites sombrias, aquela mãe. Pela manhã, engolia a dor e sorria esperança. Sorria para o futuro que, lutava para acreditar, a filha ainda teria. Mas ela própria se encontrava destruída, não mais vivia: sofria.

Não quis machucá-la outra vez, acordando-a para um pesadelo que fingia esquecer. Onde a realidade era o medo. A revolta. A impotência. A culpa que jamais teve, mas que  atribuiu a si mesma por não ser onipresente e não estar lá, na hora fatal.

Precisei fazer sangrar feridas, contudo, que jorraram na forma de lágrimas de olhos entristecidos. Para que o monstro fosse identificado, apreendido, julgado, condenado pela justiça dos homens e lançado no próprio inferno que ergueu para si, quando escolheu violar a dignidade suprema de uma criança.

Ela, a menina, sofreu a dor na pele. A mãe sofreu a dor da filha na alma. Queria não ter mais de viver, para não enxergar todos os dias sua criança mutilada. Mas precisava, mesmo com a alegria amputada de sua existência, encarar cada novo amanhecer. Por sua angelical menina.

Concluí meu trabalho, com a garganta seca e a voz embargada. A imparcialidade profissional não me obriga a ser desprovida de emoções – felizmente, me emociono! Tenho sentimentos, e eles me impelem para a ação tão bem feita quanto possível. Para que haja justiça. Para que exista a possibilidade de paz em algum futuro ainda distante. Para que se vislumbre a luz, quando tudo que se tem é completa escuridão.

Ela entendeu. Secou as lágrimas e se levantou, estendeu-me a mão e eu estendi um abraço. Ela sorriu! Trancou novamente a dor no coração, e partiu. E eu fiquei com a imagem daquele sorriso gravada em minha memória.

Quanto altruísmo! Revestir-se de força e alento que ela mesma não possui, para ter o que ofertar a  filha amada. Grandeza. Verdadeira coragem. Vitória absoluta do amor sobre a dor.

“Língua alguma é capaz de expressar a força, a beleza e o heroísmo do amor de uma mãe” – Presidente David O. Mckay


Suzy Rhoden

domingo, 13 de julho de 2014

Brasil, País do... Ídolo Fabricado!


Alguém aí aguenta mais um texto sobre os vexames que a Seleção Brasileira protagonizou nos últimos dias? Nem eu, por isso não escrevi antes. Não tenho a menor pretensão de ser comentarista esportivo a esta altura do campeonato, digo, da “Copa das Copas”. Já basta uma série de comentaristas sem noção que figuraram por aí ao longo do mês... Já basta a mídia tendenciosa saturando qualquer torcedor, enfiando goela abaixo aquilo que se quer fazer acreditar. Não agirei da mesma forma com meu leitor.

Mas, paradoxalmente, buscarei na seleção derrotada minha inspiração. Não diziam os antigos que quanto mais alto o pedestal, maior a queda? Foi exatamente o que vi acontecer com o tal País do Futebol. Sim, é meu país, sempre será. Com orgulho pintarei a face de verde amarelo e direi que sou brasileira, em qualquer situação. Inclusive agora, na hora da ressaca futebolística. Mas ser realista é saudável e necessário. Faz bem a um país que há muito porta um título ao qual não faz jus; e, ainda que o fizesse, que vantagem há de fato em portar tal titularidade?!

Vejo idolatria desproporcional a simples desportistas. Acaso são deuses por correrem com  habilidade atrás de uma  bola?! São meros mortais, nem para referência de vida maioria desses garotos serve! Basta avaliar seu histórico de escândalos e inconseqüências... Por outro lado, diante da menor falha são expostos, ultrajados, crucificados. Num dia, ovacionados. No outro, alvos do desprezo de uma nação.

A culpa é nossa, quando fazemos esses meninos acreditarem serem heróis! Jogamos sobre eles pesos que não lhes cabem nos ombros, exigimos um mito nacional. Que foi aquela rasgação de seda diante da fratura do Neymar?! Precisava mesmo de tudo aquilo?

Essa mania de endeusar gera exibicionistas ao invés de profissionais disciplinados. Provoca anseio por ostentação e glamour ao invés de foco, autocontrole e determinação. Mesmo as histórias mais lindas de vida e de superação são logo soterradas pela arrogância de se chegar aonde chegou. Do topo, a vista já não alcança a infância humilde e simplória. A fama fala tão alto que a aridez do caminho é de imediato esquecida. O resultado é o que saturamos de ver nesta semana...

Basta dessa idolatria sem sentido! Que faz com que impere o ‘jeitinho brasileiro’, acreditando-se que no final tudo dará certo e a taça cairá do céu em mãos brasileiras! Não é assim que se fazem grandes conquistas, e sim com trabalho árduo, com foco e diligência. Nosso time teve o que mereceu, ou melhor, deixou de ter aquilo pelo que apenas sonhou e não lutou. E isso não é o fim do mundo, é apenas o recomeço: hora de entender que vence quem joga mais e melhor!

Não estou chorando o fim desta copa e nem a derrota de minha seleção. Nem estimulei lágrimas em meus filhos. Eles torceram por seu país, gritaram esperando gols que não vieram na hora mais necessária. Mas entenderam que jogos são ora vencidos, ora perdidos. E não ficaram traumatizados com o desfecho vexatório de sua seleção na primeira copa de suas vidas.

Espero, justamente, que lembrem de que só vence quem segue com garra até o final. E, mesmo com garra, às vezes haverá outro time ou outra pessoa com mais habilidade, mais experiência, maior capacidade. Aí tem de entrar em campo a persistência: seguir praticando, treinando, aperfeiçoando. Não há tempo e nem espaço para estrelismos, esse é o primeiro indicativo de fracasso futuro.

Foi-se a copa e não faz mal, como disse outrora Drummond. Quem sabe não seja  hora de esquecermos um pouquinho das referências do futebol e olharmos para outros profissionais que, anonimamente, erguem nossa nação todos os dias?

Mais do que isso, me parece ser  hora de deixarmos a arquibancada e a posição cômoda de torcedores, para nos engajarmos em causas que valham a pena: se queremos bons exemplos, sejamos nós essa referência plena de brasilidade em qualquer lugar que nos encontremos. Em qualquer profissão.

Quando vencermos a tradição de fabricar ídolos, estaremos finalmente aptos a falar de ordem e progresso. Saberemos, coletivamente, fazer progredir uma nação, ao invés de projetar expectativas  num heroi idealizado.

Suzy Rhoden
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