sexta-feira, 15 de julho de 2011

Esta arma, a palavra!


Neste momento em que me preparo para exercer a função de policial, considerando rigoroso curso de formação e treinamento específico, faço um retrospecto em minha mente de quando ganhei o porte de minha primeira arma, a palavra.

Para essa não houve nenhum curso, quando dei por mim, já estava armada. Não pensem que saí por aí atirando, eu era muito tímida para isso. Falava somente quando solicitada. Para compensar, escrevia, escrevia. Pensava que, agindo assim, a arma estava guardada, trancada a sete chaves, junto com minha (falta de) eloqüência. Que nada, com o passar dos anos descobri que ela esteve o tempo todo engatilhada...

Mas, até onde me lembro, não houve nenhum disparo acidental. Não durante a infância. Quando me descobri adolescente, porém, com aquela arma na mão e nenhum manual de instruções, foi catastrófico! Claro que eu queria atirar, e na ansiedade juvenil, mirava para qualquer lugar, a qualquer tempo, e lá se ia uma bala perdida! De mortos não tive notícias, mas foi grande o número de feridos. Pois a palavra mal conduzida fere, mutila, estraçalha.

Lembro, com certa dor, de como ganhei consciência da força de minhas palavras, não importa se faladas ou escritas. Numa brincadeira aparentemente inofensiva, uma amiga e eu criamos um personagem e o colocamos em comunicação com a jovem com quem eu dividia apartamento durante a faculdade. Era um admirador secreto. Um galanteador nos moldes antigos, romântico e cheio de simbolismos, falava através de letras de música e poesias. Assim que o primeiro email teve resposta, não resistimos a vaidade, e criamos um outro, e mais outro, e... como parar uma avalanche?! Era para ter sido apenas um personagem, mas ele ganhou vida e assustadoramente esteve próximo de ser o pivô do fim de um relacionamento, pois não poderíamos imaginar o quanto minha amiga se deixou ser envolvida pelas lisonjas de um desconhecido.

Deveria ter sido apenas uma  brincadeira, mas como a criança que encontra a arma em casa e começa a brincar com ela até que ela dispara, descobri-me entre os feridos. E feri minha querida amiga. Não ficaram mágoas, contudo. O disparo foi mesmo acidental, ou algo semelhante a isso. Mas muitos há por aí, no mundo virtual, que escolhem bem suas vítimas, pacientemente se acercam delas, até tê-las sob total controle e pontaria... Atenção para a flecha lançada, palavras têm vida!

A experiência compartilhada justifica um certo trauma, e a arma silenciosamente recolhida. Desta vez, sim, trancafiada em cofre. Mas não para toda vida. Nunca me desfiz das chaves. Ao contrário, tratei de me aperfeiçoar na arte de atirar. Fui aluna dedicada na Escola da Vida. Matriculei-me em cursos, fiz especializações. Observei os mais experientes, e quanto se aprende só observando! Quando me senti segura, voltei no tempo e recuperei  minha arma, pronta para ir à batalha e sair vitoriosa de todas as minhas lutas.

E minha batalha é esta: elevar quem me ouve, edificar quem “me lê”. Promover sincera e profunda reflexão. Oportunizar o compartilhar de saberes, a troca de experiências que conduz ao aperfeiçoamento individual, certa de que o reflexo desse virá no aspecto social. Tanto quanto Lygia Fagundes Telles, desejo ser uma testemunha do meu tempo e da minha sociedade, comunicando-me com meu próximo e  “se possível, mesmo por meio de soluções ambíguas, ajudá-lo no seu sofrimento e na sua esperança”.

Sou hoje totalmente operacional. Porto minha arma dentro da legalidade, e somente a utilizo em casos de necessidade. Acabo de usá-la, neste exato momento, para alertar sobre seus riscos... e fazer um apelo aos que, como eu no passado, estão brincando com o perigo, atirando para cima em tom de diversão: podem ferir e sair feridos! Ou se faz uso consciente de sua arma – sua palavra, escrita ou falada – ou, por favor, hora de cumprir com o Estatuto do Desarmamento.   
Suzy Rhoden
Gravataí, 15 de julho de 2011

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