Confesso que havia em mim uma implicância injustificada com o título da famosa obra de Moacyr Scliar, O Centauro no Jardim. Obra rica de simbologia, certamente. Não era isso o que me incomodava e muito menos qualquer falta de qualidade nos escritos desse grande homem da literatura nacional... mas, um centauro?! Dentre tantos seres da mitologia grega, esse era o que mais completamente me desagradava e havia de mim em relação a ele uma antipatia gratuita. Não gostava do centauro. Criatura mais estranha! Mas gostava muito do trabalho de Scliar, e numa noite afortunada parei para ouvi-lo...
Feira do Livro de Santa Maria, outubro de 2010. Eu não imaginava que aquela seria minha última oportunidade de ouvir e aprender com Moacyr Scliar, antes de sua partida deste estágio de vida. Diante de platéia atenta, ele discorria sobre sua obra e, naturalmente, chegou ao centauro. O que eu não imaginava é que o “bicho” incomodava mais gente por ali, pois a pergunta lançada foi justamente essa: por que um centauro, entre uma infinidade de seres mitológicos à disposição? E a resposta não poderia ser mais desconcertante: foi exatamente esse o ser que nasceu dentro de mim em algum momento de minha trajetória, começou a galopar, e nunca mais parou.
Eu não precisava ouvir mais nada naquela noite. A antipatia não era gratuita, mas uma rejeição natural a um ser que, sem ser convidado, andava a galopes dentro de mim. Queria expulsá-lo. Mas, forte e resistente, historicamente acostumado à rejeição, ele não somente ignorou meus protestos, mas fez-me ouvir, sobretudo no silêncio das madrugadas, o impacto de seu movimento, para lá e para cá, dentro de minha mente. Negá-lo é declarar guerra a ele, que de qualquer modo não irá embora. Aceitá-lo é responder afirmativamente a um delicioso convite para explorar a galope terras desconhecidas, estradas nunca cruzadas... sob sério risco de incompreensão!
Sábio Moacyr Scliar que me inspira nesta noite! Nasceu escritor, formou-se médico, partiu desta vida Imortal, assinando vasta e diversa obra. Brilhante caminho profissional percorrido. Vejo seus passos seguros se perderem de vista a minha frente, na direção do horizonte... Mas ficou algo para trás, deixou-me como herança este centauro galopante!
E agora, que faço eu com ele?!
Suzy Rhoden
Gravataí, 06 de julho de 2011
rsrs, também não sou chegada em Centauro, mas adoro Scliar! Saudades de suas entrevistas, de suas histórias encantadoras e de suas crônicas que muito me ensinaram. E sobretudo de sua postura nada arrogante como escritor, este foi o mais forte marco de sua herança. Gostei muito deste seu texto, Suzy.
ResponderExcluirE continuando com Scliar, você vai adorar um conto dele: o Turista Secreto.
Clique aqui:
http:pedrolusodcarvalho.blogspot.com/2010/12/moacyr-scliar-os-turistas-secretos.html
Um beijo
Tais Luso